Anvisa regulamenta uso medicinal do Canabidiol. Defensoria tem ações judicias para acesso aos tratamentos
Uma vitória para além dos papéis e ações judiciais. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) liberou nesta terça-feira (03) um novo regulamento para produtos medicinais derivados de cannabis. A regulamentação aprovada será publicada no Diário Oficial da União nos próximos dias e entrará em vigor em 90 dias. Antes da regulamentação, cada novo usuário precisava passar por longa etapa de laudos, provas e documentações para obter a autorização para importação, em prazos que demoravam pelo menos 30 dias.
Quem celebrou a notícia é a dona de casa Margarida Alencar é mãe do João Gabriel de 12 anos, diagnosticado com paralisia cerebral. “Essa decisão é uma vitória, porque vai facilitar a compra. Quantos estão atrás e não conseguem?”, disse. Em 2018, ela recorreu à Defensoria Pública do Estado para ter acesso ao medicamento a base de cannabis. Perdeu em primeira instância e os defensores foram ao Tribunal de Justiça e recorreram da decisão. Somente após 12 meses do ingresso, recebeu parecer favorável para o tratamento. A família ainda aguarda receber o medicamento previsto para chegar em dezembro pela Secretaria de Saúde do Estado. “Meu filho chega a ter dez convulsões em um dia, ele já chegou a ter 15. Cada convulsão dessa é um desespero, é desgastante, não consigo segurar ele. Sabemos que isso prejudica o cérebro e que com a medicação correta melhoraria muito a nossa vida. Semana passada, pela primeira vez, ele teve de ir à emergência, ficou convulsionando de três até cinco horas da manhã. Isso é desesperador. Acredito que, a partir do momento que ele passar a tomar esse remédio, vai melhorar, principalmente as convulsões, além da parte motora e cognitiva”, relata Margarida.
O medicamento é um componente extraído da planta cannabis sativa e pode ser utilizado no tratamento de doenças que acometem o sistema nervoso central, por exemplo a epilepsia, sem causar alteração psíquica alguma. Mesmo agora tendo a sua comercialização regulamentada, o medicamento ainda é de alto custo e será na Defensoria Pública do Estado e da União que as pessoas que não têm condições de pagar pela medicação poderão recorrer. Durante os anos de 2018 e 2019, cinco casos foram atendidos pelo Núcleo de Defesa da Saúde da Defensoria Pública do Estado do Ceará.
Destes processos abertos pelo órgão, três casos foram deferidos. De acordo com a defensora pública Karine Matos, titular do Núcleo de Defesa da Saúde (Nudesa), a liberação pela Anvisa significa um grande avanço. “São processos geralmente longos, onde as pessoas precisam recorrer a vários laudos, documentos e antes da regulamentação era mais uma etapa que o nosso assistido precisava fazer, em busca das documentações. É claro que quem não puder buscar esse medicamento na rede privada, vai precisar recorrer ao judiciário, mas agora o processo se tornou menos burocrático. Temos a constatação do quanto esse medicamento é necessário para o tratamento de inúmeras doenças. Tanto médicos como os assistidos que recorrem ao núcleo descrevem as melhorias nos sintomas das doenças. É um marco para nós que atuamos com questões assim diariamente”, destaca a defensora pública.
Em julho de 2018, sem poder custear o valor do remédio e com os custos de entrega, a secretária Rita Helena Lima, 40, procurou o Nudesa. No mesmo mês, o juiz de direito Paulo de Tarso Pires Nogueira, atendendo o pedido de urgência da Defensoria, decidiu por procedente a decisão da disponibilização do Canabidiol para a filha Ana Júlia Rocha de Oliveira, hoje com sete anos. Foi a primeira vitória na Defensoria Pública para o uso medicinal do Canabidiol. Há um ano, a criança toma o medicamento duas vezes ao dia. As pequenas doses de 0,4ml são suficiente pra mudar um cenário que, antes, aterrorizava a vida da mãe. Ana Júlia chegava a ter cerca de 30 crises de epilepsia durante o dia, em decorrência da paralisia cerebral, mas hoje esse cenário mudou. “Aos poucos ela está conseguindo recuperar movimentos e melhorando. Eu só tenho agradecer pelo importante trabalho da Defensoria, que viabilizou uma melhora na qualidade de vida da minha filha. Ana Júlia é uma criança abençoada, já enfrentamos muitas dificuldades, mas com fé em Deus vamos vencendo”, acredita Rita.