Posso ajudar?
Posso ajudar?

Site da Defensoria Pública do Estado do Ceará

conteúdo

Decisão abre possibilidade de adoção de neto pela avó após recurso da Defensoria

Publicado em

avo e filho

Adotar é tornar filho alguém que fora concebido por outras pessoas. É ainda um ato jurídico que cria entre estas pessoas relações jurídicas idênticas às que resultam de uma filiação de sangue. Com este entendimento, em uma decisão inédita, o Tribunal de Justiça do Ceará julgou favoravelmente à adoção de um neto por sua avó após um recurso da Defensoria Pública, abrindo a possibilidade agora para avós pleitearem a adoção. O desembargador Durval Aires Filho considerou o princípio do melhor interesse da criança, entendendo que ficar com a avó seria a opção mais acertada, uma vez que a mesma detém a guarda do neto desde o nascimento e ficou provado que os pais biológicos não tinham condição de cuidar do filho.

O caso chegou à Defensoria Pública através do Escritório de Prática Jurídica (EPJ) da Universidade de Fortaleza (Unifor), um dos 17 espaços em faculdades do Estado onde os alunos dos últimos semestres do curso de Direito, sob a supervisão de defensores, prestam atendimento jurídico gratuito à comunidade, graças a convênios com a Defensoria Pública do Estado do Ceará. A defensora Camila Vieira conta que recebeu dos universitários a petição solicitando a adoção da criança pela avó. “Embora bem fundamentada, o juiz de primeiro grau extinguiu o processo sem julgamento do mérito por entender incabível o pedido tendo em vista que o ECA veda a adoção de descendente por ascendente”, comenta.

A defensora explica que, no Brasil, por conta de uma fraude recorrente foi vedada a adoção de descendente por ascendente. Muitas vezes, na tentativa de não cessar os provimentos previdenciários de avós (caso de aposentadorias e pensões, por exemplo) algumas famílias recorriam à adoção de neto pelos avós. Daí o dispositivo do Estatuto da Criança e do Adolescente que proibiu expressamente (Artigo 42 § 1º) a adoção por ascendentes, ou seja, os avós que pretendiam adotar seus netos.

A Defensoria Pública recorreu da decisão por compreender que é preciso observar o caso em questão de forma individual e o melhor interesse da criança. O recurso, elaborado pelo defensor público Adriano Leitinho, teve parecer favorável do Ministério Público. “O recurso foi proposto porque entendemos que não se pode analisar a norma legal de forma tão restritiva e isolada. Devemos lembrar que estamos dentro de um sistema de normas que se entrelaçam entre si formando um ordenamento jurídico composto de princípios e regras. E exatamente fundados nos princípios da afetividade e do melhor interesse da criança e do adolescente, normas com mais força que o artigo 42 do ECA, elaboramos a peça. No nosso entendimento, a negativa da adoção contrariaria uma situação fática já consolidada. Os vínculos afetivos de mãe e filho entre a avó e a criança já estavam consolidados e, caso não fossem reconhecidos juridicamente, só trariam problemas psicológicos e sociais para o infante”, explica o titular da 3a Defensoria Pública da Infância e Juventude.

Adriano Leitinho ressalta a importância da decisão: “Ela é inédita aqui no Ceará, mesmo porque predominava o entendimento de que avós não poderiam adotar seus netos em razão da proibição legal expressa do art. 42 do ECA. Este dispositivo foi criado buscando evitar burlar o INSS, já que a adoção não pode ter fins econômicos. No entanto, ocorre que os casos devem ser analisados isoladamente e não de forma genérica. Assim, se provado que não há fins econômicos e que os avós já criam o neto como filhos desde cedo, já tendo vínculos paternais constituídos, não há motivo para proibição da adoção, conforme inclusive entendeu recentemente o STJ”, afirma o supervisor.

Segundo o defensor, a decisão abre possibilidade agora para que outros avós que já possuem comprovado que exercem as funções pai/mãe de modo substitutivo aos pais biológicos possam vir a regularizar a adoção de seus netos, permitindo assim que essas crianças e adolescentes tenham sua situação jurídica reconhecida.