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Defensoria Pública atua em casos de LGBTQfobia no interior do Ceará

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A liberdade de expressão é um direito previsto na Constituição Brasileira de 1988. Mais do que contemplar a dimensão individual, o livre expressar de quem se é possui também um viés coletivo, o que significa que todos(as) têm o direito de serem acolhidos(as) na sua livre expressão em sociedade. Mas a letra da Lei encontra obstáculos para se efetivar na realidade de lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais, queers e outras orientações sexuais, expressões e identidades de gênero – a população LGBTQ+. Um levantamento recente do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH) registrou 1.685 denúncias de violência contra a população LGBT em 2018. Os dados coletados pelo Disque Direitos Humanos, o Disque 100, revelam que a maioria dos casos foram de discriminação (70,56%), seguidos por violência psicológica (47,95%) – como xingamentos, injúria, hostilização, humilhação, entre outros -, violência física (27,48%) e institucional (11,51%).

Visando coibir os frequentes casos de LGBTfobia registrados no país, em junho deste ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu enquadrar a homofobia e a transfobia como tipo penal definido na Lei do Racismo (Lei 7.716/1989), até que o Congresso Nacional legisle sobre a matéria. Desde então, as violências homofóbica e transfóbica passaram a ser consideradas crimes.

Falar do tema também assume função relevante. A Defensoria Pública do Estado do Ceará tem a missão constitucional de promover o acesso à justiça e educar sobre direitos. Em junho deste ano, a instituição lançou a série de reportagens Orgulho LGBTQ+, sobre a rede de assistência a essa população em Fortaleza. Mas os relatos recentes de agressão a LGBTs em municípios do interior do Ceará, porém, mostram que ainda há muito a avançar, para que todos(as) sejam respeitados(as) em sua cidadania e expressão.

A denúncia é um ato de coragem para muitos LGBTs que se sentem hostilizados em cidades do interior. Henrique*, morador de Quixadá, no Sertão Central cearense, não suportou mais ouvir tantos insultos e xingamentos por causa da orientação sexual dele. O basta nas violências sofridas veio por meio de denúncia feita por ele no Disque 100, do Governo Federal. O caso foi repassado para a Defensoria Pública em Quixadá, que prestou assistência jurídica a Henrique. “Notificamos o suposto agressor e explicamos que ele poderia ser enquadrado em algum tipo penal. Também falamos com ele sobre as consequências cíveis de atitudes ofensivas, que poderiam resultar em indenização. Após essa mediação, ele reconheceu e se comprometeu a parar com atitudes de discriminação”, relembra o defensor público Júlio César Matias Lobo, titular da 2a Defensoria de Quixadá.

Na época do atendimento de Henrique, a homofobia ainda não era tipificada como crime. Após o entendimento do STF, o defensor público explica como são os procedimentos. “Primeiramente, oficiamos o delegacia do município para instaurar o inquérito e apurar o crime. Além disso, se a vítima da agressão precisar de apoio psicológico e assistencial, oficiamos os órgãos competentes para cuidar da integridade de quem sofreu a LGBTfobia. E claro, também podemos pedir ação indenizatória”. Para o defensor, o estímulo ao respeito também precisa ocorrer pela via educativa. “Uma lei somente não resolve, precisa de informação também. As pessoas, muitas vezes, desconhecem que respeito a valores como liberdade e a dignidade são igualmente importantes como defender a vida, por exemplo. Por isso, a Defensoria também atua para explicar às pessoas sobre os direitos delas”, ressalta.

Preconceito no trabalho – A face do preconceito também se mostrou para Melissa Forte, 23 anos, moradora de Sobral. A identidade de gênero feminina não era bem aceita pela família da jovem desde o princípio. Chegou a mudar-se para Fortaleza, para buscar oportunidades profissionais. Na capital, iniciou sua transição. “Foi uma transformação bem natural e tranquila, fui passo a passo. Morava em Fortaleza e foi dando certo. Não gerava tanto impacto”, afirma. Quando teve que voltar a Sobral, aumentou nela o desejo de retificar nome e gênero na documentação, um passo que ela considerava imprescindível não apenas por desejo pessoal, mas também para se sentir melhor em futuros empregos.

O primeiro passo nesse processo foi procurar a Defensoria Pública em Sobral, onde foi atendida pela defensora pública Emanuela Vasconcelos Leite. “A Melissa chegou aqui informada sobre a lista de documentos que precisava providenciar, mas veio até a Defensoria porque estava encontrando dificuldades. Por exemplo: ela não era registrada em Sobral, então nós entramos em contato com o cartório de origem dela solicitando a segunda via do registro de nascimento, pois ela não tinha como ir até lá”, explica Emanuella, que é supervisora do núcleo defensorial no município. A Defensoria Pública garante a representação do(a) assistido(a) que deseja retificar nome e gênero na documentação em todo o procedimento administrativo junto aos cartórios, de forma gratuita, uma vez constatada a hipossuficiência do(a) requisitante (Clique aqui para saber como realizar o procedimento).

Meses depois, Melissa estava com o documento em mãos, pronta para iniciar uma nova etapa. “Já passei por um emprego em que eu poderia estar até hoje, mas fui demitida por ser transexual. Meu desempenho era muito bom, mas eles justificaram minha demissão por conta um único atraso meu, certa vez. Mas eu senti mais como preconceito mesmo”, relembra. A jovem pontua ainda que não baixa a cabeça para comentários transfóbicos, não importa o lugar em que são pronunciados ou, muitas vezes, insinuados de forma velada. “Por onde passo, busco me impor respeito, porque acredito na minha personalidade”, afirma de forma orgulhosa.

Além da própria força e coragem, a população LGBTQ+ em Sobral também pode contar com uma rede de apoio e assistência, da qual a Defensoria Pública faz parte. “Trabalhamos com articulação com diversas instituições, participando de Conselhos, Grupos de Trabalhos temáticos e organizando eventos conjuntamente. A Coordenadoria Municipal de Direitos Humanos de Sobral, por exemplo, que ocupa o mesmo prédio da Defensoria Pública, recebe nossos encaminhamentos, no sentido de pensarmos políticas públicas de conscientização e prevenção. Nos casos individuais, quando vislumbramos a ocorrência de violência, orientamos o assistido quanto ao seu direito à dignidade físico, psicológica e social e o encaminhamos para fazer o registro da ocorrência também na esfera criminal, quando for o caso, sem prejuízo das ações cíveis, que já ajuizamos, se for o caso”, afirma a defensora pública.

Atendimento a mulheres trans no Cariri – Desde o final de 2018, a população de mulheres transexuais e travestis do Cariri contam com mais um aliado na rede de proteção à violência doméstica na região. Isso porque o Núcleo de Enfrentamento à Violência contra a Mulher da Defensoria (Nudem) no Cariri, localizado no município do Crato, passou a prestar assistência também para esse público, devido à mudança na Resolução 168/2018, do Conselho Superior da Defensoria Pública (Consup). A alteração também incluiu o critério da identidade de gênero feminina para as assistidas do Nudem em Fortaleza.

Instalado em junho de 2018, o Nudem Cariri recebe demandas das cidades Crato, Juazeiro do Norte e Barbalha. O atendimento é voltado às mulheres vítimas de violência doméstica, ou seja, quando há vínculo entre vítima e agressor. O defensor público atuante acolhe a vítima e faz os encaminhamentos das demandas judiciais necessárias para proteção da mulher, com base na Lei Maria da Penha, e resguardo de todos os seus direitos. Também são realizadas orientações sobre a rede de assistência disponível para a vítima no município.

O defensor público Rafael Vilar, supervisor do Nudem no Cariri, afirma “ser de extrema relevância” acolher a população de mulheres travestis e transexuais que sofreram violação de direitos. O defensor ressalta que essas vítimas podem ser atendidas mesmo não havendo vínculo doméstico com o autor da violência, que pode ser física, verbal, psicológica, sexual e patrimonial. “Se não houver violência doméstica de gênero, o número de ações que podemos ingressar fica mais restrito, mas nós podemos acolher e dialogar com a mulher transexual e travesti, principalmente fazer as orientações extrajudiciais devidas e, eventualmente, demandar alguma ação em favor dela”, explica.

Ainda segundo Rafael Vilar, a Defensoria Pública está disponível para atender qualquer pessoas que se reconheça LGBT e tenha sofrido violências pela sua orientação sexual, identidade e expressão de gênero. Além do atendimento jurídico e extrajudicial, a instituição tem como missão promover a educação em direitos. “A Defensoria tem papel forte de promover a inclusão, a educação em direitos e o respeito a todos grupo que esteja em situação de vulnerabilidade. Esse é o caso da população LGBT, que na nossa sociedade enfrenta uma situação terrível de preconceito e ódio. Nós temos esse papel de realizar a educação em direitos em escolas e vários outros locais, para se pregar a tolerância e respeito aos grupos colocados historicamente em situação de vulnerabilidade”, defende.

Série Orgulho LGTBQ+ – A Defensoria Pública do Ceará lançou, em 2019, uma série com quatro reportagens sobre o que é ter #OrgulhoLGBTQ+. Abordamos temas como a rede de assistência à população LGBT – a qual a Defensoria integra -, a situação de transexuais internas do sistema prisional cearense e a história do grupo “Mães pela Diversidade” como base de apoio. Trazemos também uma entrevista com o diretor e ator cearense Silvero Pereira sobre ser quem se é e ter força para lutar pelos direitos de todos e todas. Para acessar as matérias, clique aqui. (http://www.defensoria.ce.def.br/noticia/defensoria-lanca-serie-orgulholgbtq-e-explica-a-rede-de-assistencia-e-protecao/)

Serviço

Defensoria Pública em Quixadá
Fórum Municipal: Rua Jesus, Maria e José, s/n – bairro Jardim dos Monólitos

Defensoria Pública em Sobral
Av. Monsenhor José Aloísio Pinto, 1.200 – bairro Dom Expedito

Núcleo de Enfrentamento à Violência contra a Mulher – Nudem Cariri
Travessa Iguatu, 304 – bairro Santa Luzia – Crato

Para demais endereços da Defensoria no interior, acesse: http://www.defensoria.ce.def.br/locais-de-atendimento/interior/