Site da Defensoria Pública do Estado do Ceará

A saga da cuidadora de idosos Fátima Matos, de 61 anos, começou em Apuiarés. Após sofrer um acidente doméstico e quebrar o braço, passou a procurar o serviço de saúde exaustivamente. Esteve em Apuiarés, Pentecoste, São Gonçalo do Amarante e, por fim, Caucaia para bater um raio-x. “Em todos os locais por onde passei, as máquinas estavam quebradas ou não realizavam o exame e só consegui fazê-lo porque paguei do meu bolso. Eu estava tão cansada dessa viagem toda, que, mesmo com dor, estava disposta a voltar para casa, mas me orientaram vir para cá. Estou sendo muito bem atendida aqui no hospital, mas a situação daqui é complicada, tem muita sujeira nos corredores e nos banheiros, além de que eu não tenho ideia de quando será a minha cirurgia”.

D. Fátima está internada no Hospital Municipal Abelardo Gadelha da Rocha, em Caucaia, na Região Metropolitana de Fortaleza. A unidade, na manhã desta sexta-feira (20.01), recebeu a visita de defensores públicos que fazem parte do Grupo de Trabalho da Saúde da Defensoria Pública do Ceará e inspecionaram o local com o objetivo de conhecer a realidade da unidade hospitalar, diagnosticar os problemas e encaminhar possíveis soluções.

De acordo com os relatos dos profissionais, a unidade hospitalar está há anos sem reforma e sem investimentos. Os defensores constataram a falta de equipamentos de raio-x e de ultrassonografia, insumos básicos da rotina hospitalar, como luvas, fios cirúrgicos e catéteres. Localizaram uma ala inteira destinada para ser uma enfermaria estava totalmente fechada, armazenando apenas equipamentos sucateados. Não haviam lençóis suficientes e os colchões dos leitos estavam rasgados.Era possível detectar muitas infiltrações nas paredes, banheiros sem funcionar, emergência sem estrutura e equipamentos adequados para receber a população. O município de Caucaia tem aproximadamente 380 mil habitantes e o Hospital deveria oferecer atendimento clínico, cirúrgico e traumatológico da região e de municípios adjacentes.

“Escolhemos as unidades hospitalares para realizar as vistorias de acordo com o número de assistidos que nos procuram na sede da Defensoria reclamando algum tipo de atendimento à saude. Analisamos quais desses locais estão tendo mais demandas e visitamos para conhecer o que realmente está acontecendo. Aqui não identificamos superlotação, mas percebemos um descredito da população com o serviço que está sendo prestado. Vimos que a estrutura física está bem deficitária, com vazamentos, péssimas instalações elétricas, salas interditadas e falta de profissionais. Como a população pode confiar em um hospital assim? Isso, inclusive, justifica a superlotação em outras unidades em Fortaleza e a não lotação dessa”.

A visita foi acompanhada pela médica Patricia Sammya Dias, diretora do Hospital. “Conhecemos a precariedade da nossa unidade hospitalar, pois contamos com uma estrutura, tanto de emergência, como de leitos, enfermaria e centro cirúrgico, inteiramente sucateada. Não estamos aqui para esconder nada e essa vistoria pode mudar essa realidade. O que tivermos condições de resolver, vamos nos empenhar ao máximo para isso, e quando fugir da nossa capacidade contamos com o apoio de instituições como a Defensoria Pública para melhorar este serviço. A população de Caucaia não merece viver essa situação de insegurança da saúde pública”, destaca.

O Grupo de Trabalho da Saúde da Defensoria Pública do Ceará foi criado em junho de 2016 com defensores públicos preocupados com a crescente demanda de judicialização da saúde, tanto na capital como nas comarcas do interior. A retomada das inspeções faz parte de um cronograma maior que prevê atividades judiciais e extrajudiciais com o Estado e municípios, sendo as inspeções parte do esforço concentrado para solução de conflitos entre usuários e o sistema de saúde. Ainda de acordo com Silvana, inicialmente o cronograma é até janeiro de 2017, podendo ser estendido porque as visitas acontecerão ainda no interior. “Todas as informações colhidas constarão em um relatório feito pelo GT e apresentado em uma audiência pública sobre a temática prevista para acontecer ao final das inspeções”, destacou.

Saiba mais
As demandas da área de saúde continuam sendo as campeãs na busca por atendimento jurídico na Defensoria Pública. Diariamente cerca de 20 novos pedidos chegam ao Núcleo de Defesa da Saúde (Nudesa), que integra o Núcleo Central de Atendimento do órgão, principal porta para quem busca acesso à justiça gratuita em Fortaleza. Durante o ano de 2016, o Nudesa contabilizou 5.667 atuações.

Diante da crescente demanda, a Defensoria criou o programa Defensoria Em Ação por Mais Saúde, que estabelece um fluxo administrativo a ser percorrido para evitar o atraso de demandas que podem ser solucionadas extrajudicialmente. Assim, foi criado o Núcleo de Atendimento Inicial em Saúde (NAIS), que unificou o canal de comunicação entre Estado, Defensoria e município de Fortaleza, e possui um prazo para responder à solicitação de um assistido, da melhor maneira existente, para que o problema seja resolvido, sem que a Justiça seja acionada. Desde a assinatura do convênio, em abril de 2016, 1.889 pessoas foram atendidas, sendo 28% (529) desses pedidos resolvidos administrativamente, sem necessidade de entrar na Justiça. “A nível de comparação, em 2015, todas as pessoas que procuravam atendimento no núcleo tinham suas demandas judicializadas. Não existia esse canal de comunicação, e apesar, dos números reduzidos, trabalhamos primeiramente a extrajudicialização”.