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Homem preso injustamente por oito meses é solto nesta segunda (7)

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“Quando eu vejo um caso de injustiça eu luto até o final para devolver a liberdade e a dignidade de uma pessoa presa injustamente”. A frase é do defensor público Emerson Castelo Branco, titular do Núcleo de Assistência aos Presos Provisórios e às Vítimas de Violência (Nuapp). Na última semana, o defensor público conseguiu comprovar a inocência de mais um homem. Pedro*  estava preso desde março de 2019 acusado de estupro de vulnerável contra a enteada, quando ela tinha 3 anos de idade.

“Tudo não passou de um mal-entendido”, explica a esposa. “Minha filha estava com uma infecção e na escola perguntaram a ela quem eram os responsáveis pelos cuidados pessoais. E lá em casa dividimos essa tarefa: eu e meu esposo cuidamos dela. Ela respondeu isso. Foi aí que tudo começou”. A mãe da criança conta que, quando conheceu o atual marido, estava grávida e ele assumiu a paternidade. “Ele é o pai dela, ela o vê assim e toda a família, tanto a minha como a dele, sabe disso. Essa calúnia começou na escola e abriram um processo na justiça, sem nem nos ouvir. Não fomos chamados para prestar depoimentos, não fizeram entrevista com a nossa filha. Tudo não passou de um grande mal-entendido que transformou a nossa vida em um inferno”, relembra a esposa.

Quase três anos depois do fato, a família foi contemplada com uma unidade habitacional do programa Minha Casa Minha Vida, no bairro Bom Jardim. A esposa conta que eles se mudaram para outro endereço no mesmo bairro, mas como sabiam que havia esse processo tramitando, informaram na delegacia e para o advogado particular, que à época acompanhava o processo, sobre a mudança de endereço. Em março deste ano, Pedro foi parado por uma blitz policial e preso. Não constava no processo a mudança de endereço e Pedro passou a ser considerado foragido. “Como estávamos com a nossa filha no carro, os policiais deixaram a gente se deslocar para a delegacia no nosso veículo e eles foram seguindo. Lá meu marido falou para a nossa filha que aquilo era um hospital, que ele estava doente e que ia precisar ficar por um tempo. Até hoje ela acredita nessa história que o papai está em um hospital. Foi muito difícil passar todo esse tempo sem ele aqui. Eu não quero esse trauma para a nossa filha”, comenta a esposa.

Desde então, a família tenta provar a inocência de Pedro. “Eu vi na televisão o caso do Antônio Cláudio, que ficou preso muitos anos por um crime que não cometeu e o defensor do caso dava uma entrevista na televisão. Eu não tinha procurado antes a Defensoria, porque eu pensava que a instituição era uma coisa muito distante, um órgão difícil de acessar e que o advogado particular iria me responder mais rápido. Mudei de opinião e hoje sou eternamente grata à Defensoria que devolveu a minha família”, complementa.

O defensor conta que o caso chegou ao seu conhecimento em setembro deste ano. “A família tinha a convicção da inocência dele e eu também acreditava nisso, mas não bastava só acreditar ou fazer o pedido de liberdade. Era preciso fazer um trabalho de investigação defensiva, levantar provas de sua inocência, convencer o promotor e a juíza disso. A partir daí foi uma longa caminhada. Conseguimos finalmente o relaxamento da prisão, com o parecer favorável do Ministério Público e a sentença absolutória da juíza. Eu tinha prometido para a filha dele que eu ir levar o pai dela de volta pra casa. E deu certo, esse dia chegou”, comemora o defensor Emerson Castelo Branco.

Após o pedido de liberdade da Defensoria Pública, o representante do Ministério Público requereu a absolvição do acusado com base no princípio de in dubio pro reo. A expressão latina é um princípio jurídico, significa “na dúvida, em favor do réu” e está baseado na presunção da inocência, segundo a qual ninguém é culpado até que se prove o contrário.  Isso significa que alguém só pode ser condenado se existirem provas concretas. Se houver dúvidas ou falta de provas em relação à autoria ou à materialidade do fato, a ação será julgada em favor do réu, isto é, ele será absolvido. Foi este o entendimento da juíza da 12 Vara Criminal, Maria Ilna Lima de Castro, que escreveu em sua decisão “uma condenação não pode basear-se em mera possibilidade, nem mesmo em fortíssimos indícios, é necessário prova concreta, irrefutável. A condenação exige certeza e não basta, sequer, a alta probabilidade, que é apenas um juízo de nossa mente em torno da existência de certa realidade. De fato, não há nos autos provas robustas que possam levar a uma condenação do denunciado”, atesta a decisão. Diante da insuficiência de provas, a juíza declarou improcedente a denúncia e absolveu o réu. Pedro foi solto nesta segunda-feira (07), após oito meses de prisão cumprindo pena na Casa de Privação Provisória de Liberdade III, em Itaitinga.

“Eu acredito que o objetivo de todos nós, atores do sistema de justiça, seja o defensor público, o promotor, o juiz ou delegado, é o mesmo: que os inocentes sejam absolvidos e os verdadeiramente culpados recebam uma pena justa e a cumpram com dignidade. Por isso eu acredito muito em duas palavras quando se fala em processo penal: cooperação e diálogo. Nós precisamos dialogar e cooperar mais. Neste caso, o Ministério Público escutou a defesa e verificou que era caso de absolvição, a juíza aceitou o parecer e também verificou isso. Então, essa cooperação entre todos os atores do sistema penal de justiça é fundamental para que nós possamos melhorar e ser mais eficientes. Todos nós devemos buscar o mesmo objetivo e estar de coração aberto para mudar nosso entendimento”, reforça o defensor público.