Defensoria debate violência policial em audiência pública na Assembleia Legislativa
A Defensoria Pública Geral do Estado (DPCE) participou nessa terça-feira (8/11) de audiência na Assembleia Legislativa do Ceará (Alece) que discutiu o aumento das mortes decorrentes de atuação policial. A assessora de relacionamento institucional, defensora Lia Felismino, representou a DPCE no evento, parte integrante da 5ª Semana Cada Vida Importa e proposto pelo deputado Renato Roseno (PSol) como forma de apresentar à sociedade civil estatísticas sobre o assunto.
Os dados constam em relatório do Comitê pela Prevenção de Homicídios na Adolescência, da Alece. O documento indica aumento de 256% dos casos registrados entre 2013 e 2020 no Ceará, enquanto os assassinatos de policiais apresentaram redução de 44% no mesmo período. No Brasil, 17 pessoas são mortas diariamente fruto da ação de agentes estatais de segurança.
Lia Felismino destacou a atuação da Defensoria em favor de famílias dilaceradas pela violência policial, como o ocorrido na Chacina do Curió, na qual 11 pessoas foram mortas a tiros por policiais em uma periferia de Fortaleza. Ainda sem solução, o caso é acompanhado pela DPCE e as famílias são assistidas pela Rede Acolhe, programa da instituição que atende de forma multidisciplinar às vítimas de violência e aos familiares delas.
“A Defensoria existe há 25 anos. É a mais nova instituição do sistema de justiça. A que tem menor orçamento também. Mas nós deixamos de ser uma instituição que oferece apenas assistência jurídica para nos enxergarmos como uma instituição promotora de direitos humanos. O trabalho da Defensoria é dirigido para rostos com cor, porque são principalmente os jovens pretos que estão sendo exterminados. É dirigido para pessoas”, afirmou Lia, destacando também o que a DPCE tem feito a partir do Centro de Justiça Restaurativa (CJR), que em breve deve passar por um processo de interiorização.
Mãe de uma das vítimas da Chacina do Curió, Edna Carla cobrou do Estado uma resposta. “Onze pessoas foram impedidas de viver. O Estado mata e deixa a nossa cova aberta. Nenhuma das vítimas morava em bairro rico. Moravam na periferia. Nós queremos nossa periferia viva! Não dá pra gente chorar nos túmulos dos nossos filhos. Faz sete anos que a gente bate na mesma tecla e pede pra pararem de matar a periferia. Mas não param”, denunciou.
Foi em decorrência da passagem dos sete anos da Chacina do Curió, ocorrida entre os dias 11 e 12 de novembro de 2015, que a audiência na Alece aconteceu. “Todas essas famílias que tiveram entes mortos em atuação policial transformaram luto em luta. Mas elas não querem vingança. Querem justiça! Algumas palavras são duras de serem ouvidas por nós, que estamos nas instituições, mas elas precisam ser ouvidas porque mais dura é a realidade dessas pessoas”, afirmou o deputado Renato Roseno.
A audiência também foi marcada pelo lançamento da campanha “O Ministério tem que ser Público”, elaborada pela Anistia Internacional em parceria com movimentos sociais, de forma a tensionar o Estado Brasileiro a responsabilizar os autores desses assassinatos. Por serem agentes públicos de segurança os autores dos crimes e as abordagens darem-se de maneira equivocada e distante dos protocolos, o contorno da impunidade é ainda mais cruel para as famílias.
Diretora da Anistia, Alexandra Montgomery afirmou que o relatório do Comitê denuncia como a atuação policial no Ceará é brutal e costumeira, especialmente quando as vítimas são de periferia e negras. “A Polícia segue um padrão de tortura e extermínio. Por isso, é fundamental colocarmos a Polícia no centro da discussão. Violência policial é crime e não pode ser normalizada como resposta. Essas famílias da Chacina do Curió estão há sete anos em busca de uma justiça que nunca veio.”
A coordenadora geral do Centro de Defesa da Criança e do Adolescente (Cedeca), Mara Carneiro, tipificou a pauta da segurança pública como “racista, fascista e violadora de direitos”. Para ela, não é possível falar em democracia sem debater a relação entre racismo e atividade policial, especialmente quando investimentos em assistência social despencam e a verba para repressão policial aumenta, como tem historicamente ocorrido no Ceará.
Mara Carneiro destacou estudos que indicam que 87% das pessoas mortas por intervenção policial no Estado são negras. Em Fortaleza, o índice chega a 100%. “O papel da Polícia não é o de matar. Se uma pessoa cometeu algo contra a lei, ela tem que ser responsabilizada. O Estado tem que dar uma resposta pública às chacinas. É preciso dizer que nós não aceitamos a brutalidade policial! Nós temos que responsabilizar os agressores e reparar os direitos das vítimas. Não podemos descansar enquanto não houver reparação de memória e justiça.”
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