Adolescente institucionalizado retorna ao lar após valor acumulado em benefício social ser utilizado para mudanças estruturais na residência
Toda criança e adolescente tem direito à convivência no seio da família original. Excepcionalmente, se necessário, pode ir para uma família substituta. É o que diz o Artigo 19 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Assim, a Defensoria Pública Geral do Estado do Ceará (DPCE), por meio do Núcleo de Defesa dos Direitos da Infância e da Juventude (Nadij) ou das varas especializadas, trabalha constantemente para garantir esse direito.
A história de Lucas, hoje com 17 anos, retrata bem esse esforço. Em 2017, aos 13 anos, o adolescente foi encaminhado para uma unidade de acolhimento após visitas de conselheiros tutelares identificarem a vulnerabilidade social. “A mãe havia falecido de câncer, ninguém sabia do paradeiro do pai e ele e o irmão gêmeo estavam sendo criados pelo avô afetivo, já que a avó materna estava em uma unidade de acolhimento para idosos por ter desenvolvido Alzheimer. Para piorar todo esse contexto familiar, ele tem paralisia cerebral, com grave comprometimento neurológico, e, à época, de acordo com os relatórios anexados nos autos, apresentava desnutrição. Com a morte da mãe, o irmão não frequentava a escola, possuía comportamento agressivo e comprometimento visual“, explica o defensor público Adriano Leitinho, titular da 3a vara da Infância e Juventude.
Foi quando Lucas foi encaminhado para a Unidade de Acolhimento e a Defensoria iniciou diversas tratativas para localizar um parente biológico e restabelecer os vínculos. O avô afetivo continuou as visitas na unidade e fazia vários contatos com a família paterna. Dessa forma, o pai foi localizado, a Defensoria pediu a realização do exame de DNA para comprovar o parentesco, já que Lucas era apenas registrado no nome da mãe, e a partir daí, a avó e a tia paterna de Lucas passaram a visitar o adolescente no acolhimento.
“Elas alegavam que antes não sabiam da existência do garoto e vimos a possibilidade da criação e manutenção de um vínculo com a família paterna, que antes não existia em hipótese alguma. A tia passou a visitar Lucas no acolhimento e relatou o interesse de recebê-lo em casa, mas a residência tinha problemas estruturais, era muito pequena e precisava de ajustes”, destaca Adriano Leitinho.
Por questões financeiras, a família não tinha como arcar com essas despesas e isso era o único impedimento para a transferência. Foi quando a unidade de acolhimento solicitou à vara da infância e juventude que o dinheiro acumulado em conta judicial, referente ao recebimento do Benefício de Prestação Continuada (BCP), fosse utilizado na reforma necessária para receber o adolescente. Na conta do INSS de Lucas estava acumulado um valor de mais de R$ 50 mil. “A obra foi realizada com o dinheiro do BCP, mas mediante intervenção da própria unidade de acolhimento, que ainda era a guardiã do garoto, realizando as devidas prestações de contas junto à vara especializada e nós da Defensoria fazíamos a supervisão desse fluxo”, explica o defensor.
Em 2016, a Defensoria Pública firmou parceria com o INSS a fim de efetuar cadastro de recebimento do BPC de crianças e jovens de acolhimento de Fortaleza. O defensor público Adriano Leitinho foi um dos idealizadores dessa parceria após perceber que várias crianças e adolescentes em situação de acolhimento não recebiam o devido benefício. Durante os meses que antecederam a parceria, a Defensoria esteve em todas as unidades conferindo as documentações necessárias e auxiliando na aquisição dos que faltavam para a realização desse cadastro. Na ausência da família, a administração do BPC fica a cargo do responsável pela Unidade de Acolhimento.
“Se a gente não tivesse feito isso, ele estaria no abrigo até hoje. Esse projeto modificou a vida do adolescente e como foi importante proporcionou uma maior qualidade de vida, principalmente no caso de Lucas que tem problema grave de saúde. Foi graças a esse BPC que conseguimos tirar ele da unidade de acolhimento e está agora com a família biológica. Ele está em casa, em um quarto todo adaptado, em um ambiente adequado, e o melhor, com a família, recebendo todo o carinho e atenção necessários”, Adriano.
O Benefício de Prestação Continuada (BPC) está previsto na Lei Orgânica da Assistência Social (Loas). A gestão do BPC é feita pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) e a operacionalização é realizada pelo INSS. O benefício é individual, não vitalício e intransferível, que garante a transferência mensal de um salário-mínimo.

