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Gêmeos cearenses celebram retificação de documentos por meio do Transforma

Gêmeos cearenses celebram retificação de documentos por meio do Transforma

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No especial Cidadania Colorida, conhecemos a história de dois irmãos que buscaram a Defensoria Pública com um objetivo claro: retificar seus nomes e viver plenamente suas identidades. Um papel ansiado, imenso em dignidade, que chegará no dia 04 de julho para as mãos deles.

Texto: Amanda Sobreira
Ilustração: Valdir Marte, inspirada em foto de acervo pessoal

Dois corpos que carregam a mesma história. Nascidos com apenas um minuto de diferença, Tyler e Luke do Nascimento Santos compartilham mais do que a aparência: dividem também os sonhos, as dores e a coragem de se reinventar. Aos 20 anos, os gêmeos cearenses encontram um no outro a força necessária para trilhar o caminho da afirmação de identidade como pessoas transmasculinas. É com esse apoio mútuo que celebram agora a oportunidade de retificar, gratuitamente, o nome e o gênero nos documentos oficiais por meio do Transforma, mutirão de retificação de nome e gênero da Defensoria Pública do Estado do Ceará (DPCE), que acontece nos dias 03 e 04 de julho, em Fortaleza, Crateús e Juazeiro.

“Eu estou muito feliz e muito ansioso para receber minha nova certidão e finalmente conseguir oficializar o meu nome social para que as pessoas comecem a me respeitar melhor”, conta Luke, que iniciou sua transição aos 15 anos. O processo, segundo ele, foi marcado pelo medo da rejeição familiar e pela solidão. “Eu demorei para me assumir, porque meus pais não aceitavam. Hoje, eles fingem que isso não existe. Não me apoiam, mas também não me impedem”, desabafa.

Seu irmão Tyler vivenciou uma trajetória semelhante. A identificação como um homem trans não binário fez com que ele compartilhasse com o irmão o histórico de negação e a luta por autonomia. “Nossa mãe nunca quis dar esse apoio pra gente. Então a gente esperou completar 18 anos, arranjou trabalho e começou a pagar pelos hormônios por conta própria. Foi o jeito de seguir com a transição, mesmo sem apoio”, completa.

Apesar das dificuldades, desde 2020, os irmãos buscam informações na tentativa de realizar um sonho de ser quem são. Sem sair de casa por conta da pandemia da Covid-19, eles conseguiram apoio em amigos virtuais que faziam parte de sua comunidade. Foi com essa rede de afeto online e com o amor da irmã, que eles conseguiram seguir. “Durante a pandemia, eu encontrei amigos on-line que também eram trans. Isso me ajudou muito, porque eu não me sentia mais tão sozinho. As pessoas não viam meu rosto ou minha voz, então não questionavam ou estranhavam”, lembra Luke.

Foi também por meio da internet que os gêmeos chegaram ao Transforma. Nas buscas por caminhos possíveis para garantir a retificação dos documentos, encontraram o mutirão promovido pela Defensoria Pública do Ceará, mas perderam o prazo no ano passado. “Fiquei esperando abrir de novo e, assim que saiu, mandei pro meu irmão pra gente se inscrever juntos”, lembra Luke.

Para eles, o Transforma é muito mais que uma ação pontual: trata-se de uma política pública concreta de inclusão e cidadania para pessoas trans e travestis em situação de vulnerabilidade. “A gente é de família pobre, mora em área periférica. Não ter que pagar por isso é um alívio gigante”, diz Tyler. “Sem esse mutirão, a gente dificilmente conseguiria bancar esse processo. E sem o documento, a sociedade simplesmente não reconhece quem a gente é,” lamenta.

Criado em 2022, o Transforma garante, gratuitamente, a retificação de nome e gênero no registro civil para pessoas trans e travestis nascidas ou residentes no Ceará. Neste ano, a iniciativa contempla pessoas nascidas ou residentes em 12 cidades cearenses. Após a análise e validação da documentação, as novas certidões de nascimento serão entregues durante as solenidades nos dias 3 de julho, em Crateús e Juazeiro do Norte, e dia 4 de julho, em Fortaleza. 

“Quando eu tiver meu nome no documento, vai ser um alívio. Não vou mais precisar explicar que meu nome de verdade é outro”, diz Luke. “A gente só quer ser tratado como quem a gente é. Ser respeitado não deveria ser tão difícil assim”, completa Tyler.

O serviço de retificação de nome e gênero está disponível de forma contínua na Defensoria Pública. Em Fortaleza, é realizado pelo Núcleo de Direitos Humanos e Ações Coletivas, e no interior, o serviço pode ser solicitado em qualquer unidade de peticionamento inicial da Defensoria. Basta comparecer a uma das sedes da instituição com os documentos necessários. O atendimento é gratuito. “A retificação de nome e gênero é um passo fundamental para o reconhecimento da dignidade e da identidade das pessoas trans. Não se trata de um favor do Estado, mas do cumprimento de um direito. Garantir esse acesso é afirmar que cada pessoa tem o direito de existir e ser chamada pelo nome que a representa”, afirma Lia Felismino, defensora e assessora de relacionamento institucional e responsável pelo Transforma.