Mais de duas décadas depois, Justiça cearense julgará envolvidos no Caso Curral Velho
Vinte e um anos após os fatos, a Justiça do Ceará vai, enfim, decidir o destino dos envolvidos no Caso Curral Velho, um dos mais emblemáticos conflitos socioambientais relacionados à expansão da carcinicultura no estado. Nesta segunda-feira (24), os réus Luciano Barreto Coutinho Benevides, José Werbster Gonçalves de Sousa e José Roberto Lira serão julgados pela 1ª Vara do Júri de Fortaleza pela acusação de tentativa de homicídio contra 11 moradores da comunidade de pescadores de Curral Velho, localizada no município de Acaraú (CE).
A Defensoria Pública do Estado do Ceará (DPCE) atuará ao lado do Escritório de Direitos Humanos e Assessoria Jurídica Popular Frei Tito de Alencar, do GT Interinstitucional Comunidades Costeiras e do Instituto Terramar, com o objetivo de assegurar a proteção dos direitos das comunidades tradicionais e originárias do litoral, bem como a integridade física e o direito à vida de seus membros.
O caso ocorreu em setembro de 2004, quando o delegado da Polícia Civil Luciano Barreto, o subtenente da Polícia Militar José Roberto Lira da Silva e o escrivão José Werbster de Sousa chegaram a ser presos, acusados de torturar e tentar matar pescadores da comunidade, entre eles, adolescentes. À época, os policiais eram lotados no município de Horizonte (CE), distante 278 km de Acaraú, e teriam agido a mando da empresa Fazenda Joli Pescados, denunciada pela comunidade por provocar destruição do manguezal da região.
De acordo com a denúncia apresentada pelo Ministério Público, na noite de 7 de setembro de 2004, no viveiro de camarão da empresa, os réus, que faziam segurança privada utilizando armas do Estado, efetuaram disparos, torturaram as vítimas e ameaçaram de morte outros moradores. O ataque teria sido motivado pela resistência da comunidade à entrada de máquinas da empresa em uma área de mangue então interditada judicialmente e já reconhecida como área de proteção ambiental.
Três pessoas foram atingidas pelos disparos, e outras relataram terem sido submetidas a agressões físicas e golpes de pau e cassetete. Ainda segundo o Ministério Público, foi apreendido com os acusados um arsenal composto por armas particulares e armamento pertencente ao Estado, incluindo pistolas, revólveres, espingardas, grande quantidade de munição, coletes e algemas.
Durante a tramitação do processo, o delegado Luciano Barreto chegou a ser nomeado, em 2010, para investigar o assassinato do líder camponês Zé Maria do Tomé, em Limoeiro do Norte (CE). A indicação gerou contestação da Rede Nacional de Advogados e Advogadas Populares (RENAP), devido ao envolvimento do policial no Caso Curral Velho. Pouco depois, a Secretaria da Segurança Pública substituiu o delegado na investigação. Em 2011, ele também foi afastado da Delegacia Regional de Russas (CE) após manter uma mulher acorrentada por mais de uma semana na janela da cozinha da unidade policial.
Mesmo antes do atentado e ao longo de todos esses anos, a comunidade de Curral Velho tem atuado em defesa da proteção dos manguezais da região, denunciando os impactos ambientais e sociais causados pela carcinicultura.


