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“A entrega sigilosa do filho à adoção é um direito da mulher”, alerta juiz da infância no #NaPausa – Casos Reais

“A entrega sigilosa do filho à adoção é um direito da mulher”, alerta juiz da infância no #NaPausa – Casos Reais

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A exposição sofrida pela atriz Klara Castanho no último dia 25 de junho sobre a entrega de um filho fruto de um estupro colocou na agenda nacional o debate em torno do direito de toda mulher de não exercer a maternidade. Resultante ou não de uma violência, a gestação pode ter como fim a mãe disponibilizando a criança à adoção.

A legalidade do ato foi debatida nesta terça-feira (26/7) no #NaPausa – Casos Reais, o circuito de lives para educação em direitos promovido pela Escola Superior da Defensoria Pública (ESDP) no Instagram. “A entrega sigilosa do filho à adoção é um direito da mulher. A entrega legal é um direito da mulher. O caso da Klara teve uma quebra desse sigilo. Isso é uma violência à criança”, afirmou o juiz da Infância e da Juventude em São Paulo, Iberê de Castro Dias.

Ao procurar algum órgão público e manifestar o interesse de entregar o filho à adoção, a mulher tem o direito de receber acompanhamento psicossocial e jurídico. Idealizadora do projeto Cegonha, que oferece esse tipo de serviço em Juazeiro do Norte, no Cariri cearense, a defensora pública Nadinne Callou também participou da transmissão e explicou como a abordagem a essas gestantes é desenvolvida.

“É sondado o motivo da entrega, se por maneira voluntária ou por essa mulher estar pressionada por alguma circunstância da vida passível de solução. Se ela persistir no intento de entregar a criança, a entrega será manifestada em audiência e o Judiciário vai fazer buscas à família extensa (avô, tio etc). Essas buscas são feitas em, no máximo, 90 dias. Depois, a criança é disponibilizada para adoção de uma família substituta. Mas a ideia é que ela passe o menor tempo acolhida, pelos danos decorrentes de qualquer institucionalização”, declarou.

Para o juiz, o desconhecimento de que a entrega legal é um direito da mulher ainda é recorrente e precisa ser enfrentado com a realização de mais campanhas educativas. Muitas gestantes acreditam no mito de que serão presas se buscarem o poder público para disponibilizarem voluntariamente o filho à adoção. O direito, no entanto, é garantido em lei.

“Além de ser um direito da mulher, esse é fundamentalmente um direito da criança. Está no ECA [Estatuto da Criança e do Adolescente]. O direito de se ver resguardada e protegida, porque a entrega legal é justamente para não haver o abandono na caçamba do lixo. Se a mulher não tem o desejo de ser mãe, e nenhuma mulher tem naturalmente esse dom, ela tem o direito de entregar. E fazer isso em sigilo”, sublinhou o magistrado.

Segundo Iberê de Castro Dias, o contexto mais comum é o de mulheres pobres que entregam filhos a mulheres de classes mais favorecidas. E, muitas vezes, isso se dá em troca de pequenas quantias de dinheiro, favores e até cestas básicas. Essa “troca”, ele lembrou, é crime e algo diferente da entrega legal, feita quando a gestante procura algum equipamento público e manifesta o interesse de disponibilizar o filho à adoção.

Varas da infância, conselhos tutelares, postos de saúde, Caps e Creas são só alguns exemplos de equipamentos que podem ser procurados por mulheres que desejam aderir à entrega legal dos filhos. “Os profissionais de saúde precisam ser treinados para ampararem essa mulher. Porque é raro a gente ver uma entrega ser feita de forma tranquila. Não raro, essas gestantes têm dúvidas. Quem faz o primeiro contato precisa amparar essa mulher psicologicamente. Quando o sigilo é quebrado, todo o trabalho é colocado por água abaixo. Mas é preciso que se diga que a quebra de sigilo, como no caso da Klara, é uma exceção”, pontuou o juiz.

Ele enalteceu que “na vasta maioria das vezes o sigilo é respeitado” e que essa procura de gestantes pela entrega legal não é algo pontual, acontecendo diariamente. “Quem quiser entregar, pode confiar no sistema. Não dá problema. O caso da Klara foi uma péssima exceção, demanda investigação e punição a partir do que for apurado.”

A defensora Nadinne Callou enalteceu a importância do projeto Cegonha e afirmou que muitas mulheres não aderem à entrega legal por medo de constrangimento. “O direito delas não é pleno porque existem estigmas. Elas sentem que estão cometendo um crime. Isso leva a práticas de abortamento nas condições mais absurdas possíveis ou mesmo ao abandono dessas crianças em condições insalubres. Foi para evitar essas situações que a Defensoria idealizou o Cegonha. A mulher precisa tomar essa decisão de forma consciente. A ideia do projeto é garantir adoções seguras”, concluiu.