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“Cada vez que vamos a campo, acreditamos que uma semente libertadora é plantada: aquela que cultiva mulheres conhecedoras dos seus direitos e convictas de suas vozes!”

“Cada vez que vamos a campo, acreditamos que uma semente libertadora é plantada: aquela que cultiva mulheres conhecedoras dos seus direitos e convictas de suas vozes!”

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Em meio ao verde das matas, no ritmo do ritual sagrado do Toré, as terras consagradas da Comunidade Indígena Pitaguary, receberam, na tarde desta quarta-feira (10), o primeiro encontro do Ciclo de Rodas de Conversa da Defensoria Pública do Estado, que traz à cena os perigos da violência doméstica e familiar.

O momento é uma programação do Núcleo de Enfrentamento à Violência contra a Mulher (Nudem) com articulação da Assessoria de Relacionamento Institucional (ARINS), em alusão ao dia 8 de março – Dia Internacional das Mulheres. Durante todas as quartas-feiras deste mês, a programação reforça o debate e conscientização das mulheres acerca do tema. Os próximos encontros acontecerão no loteamento Parque Santana, na Granja Portugal e no Conjunto Ceará.

A roda de conversa marca ainda o retorno do trabalho presencial da Defensoria Pública junto às mulheres indígenas. Para a defensora pública e assessora de relacionamento institucional, Lia Felismino, a ação constrói um vínculo essencial no fortalecimento das lutas das mulheres e é ponte na educação em direitos. “A visita à comunidade foi um pleito das próprias mulheres e priorizamos abrir o projeto do mês de março aqui, proporcionando um momento de conversa, de escuta e conscientização, feito esse que representa a concretização da nossa missão: promover a democratização do acesso à justiça. E a gente só consegue cumprir isso quando saímos dos nossos gabinetes para estar perto dos povos, dentro dos territórios, junto da sociedade, potencializando a nossa força”, destacou. Para ela, o momento foi especial por “compartilhar da energia grandiosa dessas mulheres que simbolizam a resistência nos dando uma carga de motivação e ânimo extra”.

A assessora da Arins reforça ainda o quanto as mãos entrelaçadas são essenciais para que oportunidades como essa sejam multiplicadas. “Este dia só foi possível em razão dessa soma de vontades, afinal, ninguém consegue caminhar sozinho. Tivemos a satisfação de contar com o apoio do Sine IDT, da ONG Ame a Vida, do Sesc, CDPDH, Esplar, Cepir, Saúde Indígena e Amice e oferecer para as mulheres uma tarde de educação, lazer e acesso à serviços básicos”, comemorou a defensora pública.

Com seu testemunho de luta e saudando a todos com sua reza, a Pajé Raimunda dos Tapebas e mestre da cultura Cearense, se alegra em hoje ver o apoio à causa das mulheres indígenas. “Em 1982, mulheres guerreiras das nossas comunidades iniciavam suas lutas sozinhas. De lá pra cá, passos importantes já foram dados e hoje podemos contar com apoio de tantos órgãos para a defesa dos nossos direitos. Isso para mim é motivo de muito orgulho, como Pajé e como mestre da cultura cearense. De todo coração que eu peço que abençoe e que nossas mulheres, as que já estão na luta e as que virão, peço que não desanimem e que façam a nossa luta crescer e acontecer”.

A condução da roda de conversa contou com a equipe de defensoras públicas e do psicossocial do Nudem. A supervisora Jeritza Lopes esclareceu às mulheres sobre os tipos de violências, como e onde buscar ajuda. “Contarmos com a presença de tantas mulheres reunidas é uma grande alegria, pois nos possibilita falar de forma mais esclarecedora, mais próxima e assim oportunizar o conhecimento e orientação sobre um tema tão essencial de ser falado que é a violência contra as mulheres. Identificar a condição de violência é um passo bem difícil, pois exige um rompimento de correntes emocionais e financeiras. Logo, explicarmos sobre os tipos de violência e encorajar essas mulheres a romperem estes ciclos é a nossa luta. “Cada vez que vamos a campo, acreditamos que uma semente libertadora é plantada: aquela que cultiva mulheres conhecedoras dos seus direitos e convictas de suas vozes!”, exclamou a supervisora.

Em continuidade, a defensora pública titular do Nudem, Anna Kelly Vieira Nantua Cavalcante,  pontuou sobre a necessidade de que as mulheres entendam que violência não acontece só quando deixa marcas físicas. O que fere a integridade, a saúde mental e emocional, é considerado um ato de violência. “Aqui, procuramos deixar bem claro que o empurrão não é normal, as palavras depreciativas, a perseguição, controle, humilhação, a obrigação sexual e tantos outros atos que evidenciem abusos – nada disso se coloca como atitudes aceitáveis dentro de uma relação, mas sim como ações abusivas expressas. Todo esse contexto de ações se caracteriza como violência doméstica. Nossa fala tem o objetivo maior de possibilitar esse olhar consciente e cuidadoso das mulheres consigo, colaborando assim para que não demorem entre 5 e 10 anos para enxergar a condição de violência. O Nudem está à disposição para prestar suporte jurídico e psicossocial”, frisou Anna Kelly.

Para Francisca Maria Alves da Silva, 54 anos, natural da comunidade Pitaguary,  os eventos dentro da comunidade possibilitam que as mulheres se fortaleçam. “É muito importante termos esse apoio, pois ver todos esses órgãos dentro da comunidade nos dar força. Nos mostra que não estamos sozinhas. Movimentos assim precisam acontecer sempre. Quando aprendemos, tomamos posse das nossas diversas possibilidades e assim vamos passando umas para outras”, compartilhou.

A força, a garra e a coragem das mulheres, de acordo com Ceiça Pitaguary, liderança da comunidade e representante da Cepir, é uma tríade determinante para a demarcação do território e para manter o povo animado, resistente e ativo. “Ter esse debate presencial, após dois anos de pandemia, aquece nossa luta e lembra que não podemos nos distrair e nem deixar de fazermos a nossa parte. Se paramos, acabamos deixando passar ações, decisões que nos atingem diretamente. Hoje, temos a oportunidade de apresentar todos os contextos de violência que podem alcançar as mulheres, seja a violência doméstica e sexual, bem elencadas na Lei Maria da Penha, como também aquela que é ocasionada por estarem à frente das lutas, atuando como liderança nessa caminhada perseverança e batalha”, ponderou Ceiça.

Na ocasião, a psicóloga do Nudem, Úrsula Malveira Goes, dividiu um pouco do dia a dia do núcleo explicando que chegam à porta mulheres que querem ajuda, mas que ainda têm dificuldades em admitir a situação de violência vivida dentro de seus lares. “Elas tentam mascarar por trás dos pedidos de guarda, de pensão, os abusos e tendo justificativas como por exemplo: mas ele é um bom pai. Então, eu argumento para que elas possam começar a refletir e ponderar: mas o que é um bom pai? É aquele que somente paga as contas, coloca comida dentro de casa e paga o colégio dos filhos? E o que esse mesmo pai faz com essa mulher na frente dos filhos? Como ficam as crianças quando crescem vendo a mãe ser humilhada, xingada, maltratada?, contextualizou.

                       

Mulher da comunidade e integrante do Conselho de Mulheres de Maracanaú, Angeluce Carvalho da Silva, 51 anos, ressalta que momentos assim encorajam as mulheres. “Sabemos que muitas têm vergonha de compartilhar as violências vividas em suas casas preferindo calar. Mas, com essa conscientização, possibilitamos que elas venham a ter motivação para dar um primeiro passo e buscar ajuda, sabendo que não estarão sozinhas em suas lutas”.

Estiveram presentes ainda a vereadora Adriana Geronimo do mandato Nossa Cara; Kelly Pessoa, assessora do mandato da vereadora Larissa Gaspar; Lívia Vieira, secretária de Agricultura e Assuntos Indígenas de Maracanaú; Margareth Rose, secretária da Mulher e Direitos Humanos da prefeitura municipal de Maracanaú; Marciane Tapeba, coordenadora da Amice;  Kelany Oliveira, do CDPDH; Carla Galiza, assessora técnica da ONG Esplar; Aparecida, da Saúde Indígena;  Sílvio Lúcio, da Coordenadoria LGBT e Igualdade Racial e Marília Bessa, da Educação e Saúde do Sesc.