Posso ajudar?
Posso ajudar?

Site da Defensoria Pública do Estado do Ceará

conteúdo

O Amor Preto Cura: conheça histórias da potência do amor preto

O Amor Preto Cura: conheça histórias da potência do amor preto

Publicado em

Fortalecer vínculos entre aqueles que amamos é uma atitude quase óbvia quando falamos de sentimentos, mas pode ser também premissa básica de resistência. Contamos aqui histórias potentes de amor preto que cura. 

Gabriela e Rodrigo

A jornalista Gabriela Feitosa, 24, é só descoberta ao lado do namorado Rodrigo Lima, 25. Juntos, eles têm aprendido sobre amar de um jeito que não haviam vivenciado antes. Rodrigo é oficialmente o primeiro namorado de Gabriela. E, segundo ela, não por acaso. “Eu tive outras relações longas que poderiam ter encaminhado para namoro oficial, mas nunca aconteceu e tenho certo de que isso tem a ver com o fato de eu ser uma mulher negra. Ser quem eu sou, ser o que sou e como as pessoas me leem, me veem, sempre influencia e sempre vai influenciar na forma como eu me relaciono e a forma como as pessoas se relacionam comigo”, pontua.

Ela conta que as relações anteriores (com homens brancos), por vezes, foram marcadas por violências simbólicas. “O amor é possível, sim, de racializar. Já é racializado quando um homem branco me sexualiza, dizendo que sexo comigo é melhor, porque eu sou uma mulher quente. É estereótipo. Ouvir essas palavras dói muito, mas é ainda mais contundente. Depois o cara fala que não tá pronto pra namorar… E aí, depois surgir com menina branca”, relembra.

O rompimento desse ciclo se deu ao emergir no amor de amigos e familiares. Em sua maioria, negros. “Hoje eu me sinto uma mulher negra, cuidada, amada, protegida, desejada, sabe? Desejada no sentido excelente da palavra. De respeito mesmo e de saber que o outro quer compartilhar uma vida”. Sem hesitar: “o amor preto cura, sim, completamente”.

Em uma viagem recente, viveu ao lado de Rodrigo um episódio de racismo. E frisa a cumplicidade desse amor. “Às vezes as coisas são ditas para essa pessoa negra sem precisar de palavras. É um olhar”. 

   

Nívia, Rômulo e Ayaná Tiê

“Na encruzilhada da parentalidade preta há muito o que ressignificar e acolher. Principalmente acolher. Essa encruzilhada não é simples, porém, libertadora”> a frase de Nívia Tôrres, psicóloga, artivista e servidora da Secretaria de Cultura do Ceará. Nívia é mãe de Ayaná Tiê, fruto do amor com Rômulo Silva, poeta, sociólogo, educador e artivista.

Eles se conheceram no acaso: um vídeo artístico durante a pandemia. Ela muda a vida e o estado de nascimento. Agora o estado civil. Caminham juntos em uma trajetória de parceria, luta e afeto.

Foto: Flávia Almeida – Fotógrafa

Salienta que o amor entre pessoas negras é também o compartilhamento de alegrias e dores, algumas delas advindas de um sistema racista. “Amar uma pessoa preta é também ter contato com algumas feridas coloniais semelhantes e, ao mesmo tempo, curadoras. Não há romantização e sim acolhimento, principalmente de si mesma. O amor preto é primeiramente a missão de amar a si”, reflete. 

O casal fala dos desafios na parentalidade. “Ser mãe negra em Fortaleza tem sido desafiador em vários aspectos, principalmente, no âmbito do trabalho, pois como pais seguimos na missão de proporcionar para nossa passarinha-fulô aquilo que não tivemos”. E derrete ao lembrar do pai que escolheu pra sua filha. “Rômulo tem sido um pai incrível. É incansável olhar para ele e nossa filha quando estão juntos”. Assim, a pauta racial é base da educação familiar. “Educar nossa erê com uma base antirracista, antixenofobica, antilgbtqiapn+fóbica, anticapacitista e antifascista é a nossa principal meta de vida”, reafirmam.

O amor preto do trio – que se propaga pelo mundo – tecem o ninho de acolhimento que conforta. “‘Oxum primeiro lava seus ouros para depois cuidar dos seus filhos’. Ou seja, para amar e cuidar de quem amo, preciso me amar, me cuidar, para dar o melhor que existe em mim. Amor preto cura quando ambos estão dispostos a isso. Eu e o meu companheiro temos caminhado e nos acolhendo, antes de tudo”.

     

Meiry Coelho, Luanna Márley e Lua

Uma amizade de 15 anos. Mais que isso, um caminhar de lutas compartilhadas. O roteiro da história de Meiry Coelho e Luanna Marley nasce no chão da rua calçada nas lutas por direitos e no tempero de uma amizade sólida. Meiry e Luanna são uma família completada por Luna, 6 anos. “A nossa família é potência, atitude, revolução. O tempo todo. Na escola de nossa filha, na rua, no condomínio onde moramos, no médico, no trabalho… O amor preto nos faz seguir tecendo redes, memórias, honrando as nossas ancestrais e o nosso amor”.

Meiry conta que os encontros e reencontros na esteira da vida, nunca tiveram gosto de despedida. “Em meio a primavera feminista, 08 de março, finalmente nos reencontramos e nos apaixonamos. Não tinha como ser diferente”. Tava escrito pra elas: foram viver juntas, rir à toa e unir as mãos na luta. Casaram. “Dissemos sim uma para a outra, mas também dizemos SIM a cada pessoa que nos ama e quer bem. Hoje casadas e mães da Luna, somos imersas na luta por um mundo mais justo e um modelo de educação inclusiva, centrado nas especificidades de cada criança”, conta.  

As vidas delas estão entrelaçadas na luta pelos direitos humanos. Meiry, educadora e socióloga, Luanna advogada popular. Ambas feministas. “As atuações profissionais no campo da educação e da defesa dos direitos humanos nos motivam a construir experiências em parceria, a partir da concepção compartilhada de justiça, direito e educação para as pessoas negras, mulheres, crianças e adolescentes”, ressalta.

Para criar uma menina linda e segura de si, carregam nas tintas das práticas pedagógicas afro-centradas e não capacitistas. “Queremos que nossa filha tenha orgulho de sua ancestralidade, da nossa família. O mundo tem muitas limitações e isso não é sobre o seu poder, a sua beleza, inteligência e capacidade”, reforça. “Luna vai crescer dizendo o seu nome e o seu sobrenome, entendendo que pode ser quem quiser. Olhando para o seu cabelo e a sua cor e lembrando das mulheres sementes que germinaram a sua história e força. Sentirá orgulho, assim como sentimos orgulho, a cada conquista dela”.