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De coordenadoria de Governo a órgão independente e forte: Defensoria completa 25 anos garantindo direitos de quem é mais vulnerável

De coordenadoria de Governo a órgão independente e forte: Defensoria completa 25 anos garantindo direitos de quem é mais vulnerável

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Existe um lugar no sistema democrático que é a fortaleza de quem precisa ser acolhido. Daqueles que, por estarem à margem de tudo, só têm os direitos mais básicos assegurados na luta dos movimentos sociais ou pela atuação de uma instituição cuja essência é a transformação. Esse lugar completou 25 anos nessa quinta-feira (28/4). É feito de gente para outras tantas pessoas, cidades adentro e sertões afora. É Defensoria, que só nos últimos três anos contabilizou mais de três milhões de atuações e alcançou, estatisticamente, direta ou indiretamente, mais de 10,7 milhões de pessoas no Ceará em decorrência disso.

Garantiu a elas o que muitas vezes deveria ser intrínseco à existência humana. Mas é negado de forma reiterada. “Mesmo sendo o mais jovem órgão do sistema de justiça, a Defensoria exerce uma função social de reparação e inclusão essencial às populações mais vulnerabilizadas. Na pandemia, a atuação de defensoras e defensores foi ainda mais fundamental porque as desigualdades se agravaram e a fome e a miséria se aprofundaram. Enquanto instituição, nossos passos são recentes. Mas, enquanto movimento de emancipação humana, de prática de cidadania, nós somos hoje o reflexo de uma trajetória de luta, de articulações, na rua e nos espaços de poder, dando voz a quem não teve a voz amplificada nos debates públicos. Nossa trincheira é essa: a da ressonância de quem de nós precisa”, afirma a defensora geral Elizabeth Chagas.

Esse caminho trilhado e os frutos dele decorrentes são objeto constante de estudo de muitos pesquisadores, inclusive de membros da Defensoria. É o caso da supervisora do Núcleo de Defesa do Consumidor (Nudecon), Amélia Rocha. “A história da Defensoria se confunde com a história da luta pelos direitos e com a história da luta pela igualdade”, sintetiza. E complementa: “a Defensoria vem como instituição para mostrar a voz das vielas e das favelas dentro dos espaços de poder. O grande papel dela é fazer com que a realidade do vulnerável, convenientemente escondida porque desagrada e expõe fragilidades do sistema, seja modificada.”

Ela afirma que a DPCE consolida-se enquanto instituição forte e independente, favorecendo, inclusive, a resolução de questões para além da atuação processual. “O papel do defensor é ajuizar uma ação? Não. O papel do defensor é o acesso a um direito. Como nós vivemos numa realidade de muitas violências naturalizadas, a Defensoria vem pra subverter isso. Ela vai se reinventando e cada vez mais garantindo a autonomia dos indivíduos”, frisa. “Há uma diferença assustadora entre a realidade da lei e a realidade da vida. Então, nosso ofício exige empatia, se colocar no lugar do outro. Não há como ser membro da Defensoria sem conhecer a realidade da vulnerabilidade. Nós nos tornamos uma instituição que, ao lutar por direitos, repercute na paz social. Porque os problemas da pobreza transcendem o pobre”, reflete Amélia.

O amadurecimento com o transcorrer dos anos é enaltecido pelo defensor Petrus Henrique Gonçalves Freire. E começa de antes de 1997, ano do nascedouro institucional da instituição. Remonta a uma época na qual defensores eram advogados de ofício e a Defensoria era uma pequena coordenadoria do Governo do Estado. Contexto bem diferente do atual, no qual a DPCE não pertence à estrutura do Executivo, é autônoma e tem demandas administrativas, orçamentárias e sociais, bem próprias.

Além de vivê-la há décadas, Petrus também transformou a atuação defensorial em estudo de pós-graduação. E garante: muita coisa mudou entre o Ceará de 25 anos atrás e o Jubileu de Prata. “No começo, não se tinha qualquer tipo de autonomia. Desde então, a Defensoria vem ganhando espaço e hoje é indispensável ao sistema de justiça. É uma jovem senhora que está começando a vida agora. Demos largos passos, em especial nos últimos anos, que nos permitiram ocupar espaços que antes não ocupávamos, mas ainda há muita coisa para caminhar institucionalmente, pontua.

Ele refere-se ao fato de que, no começo da existência, a Defensoria atuava basicamente em presídios. Hoje, um quarto de século depois, muita coisa foi incorporada e é a população é atendida em ações de família, habitacional, violência doméstica e questões envolvendo indígenas, negros e LGBTs. dentre várias outras áreas do Direito. “Isso é uma coisa que se constrói devagar mesmo. Essa capilarização é reflexo de um conjunto: surge a demanda, a Defensoria atua no esclarecimento dos direitos da população, a população desperta para aquilo ali e vai abrindo uma coisa maior. É uma espécie de troca, até porque é uma coisa de necessidade dessas pessoas e não um capricho. Por isso, a Defensoria tem mantido uma certa vanguarda. E esse é um movimento sem volta. A pandemia mostrou nossa capacidade de reinvenção. O que foi feito foi admirável”, avalia Petrus.

Outro estudioso da atuação defensorial na universidade, o defensor de segundo grau Renan Cajazeiras Monteiro enaltece que a capilarização da atuação da DPCE consolidou-se pelo esforço das primeiras gerações de membros da instituição e pela força emanada pelos movimentos sociais, notadamente nos últimos anos. Tudo isso tem sido essencial para cada vez mais pessoas em situações de vulnerabilidade terem acesso à Justiça sem precisarem pagar por isso.

“A Defensoria é completamente diferente de todas as demais instituições do sistema de justiça porque ela tem um viés que extrapola esse sistema. É isso que dá personalidade à instituição! Todas as demais ficam mais atreladas aos protocolos do sistema, enquanto a Defensoria consegue justiça fora dele. Ela não depende do sistema. Porque o sistema é viciado. É feito para moer as pessoas. E um perfil muito específico de pessoas. São negros, pobres, periféricos… A Defensoria existe para, de alguma forma, destensionar o sistema de justiça”, afirma o pesquisador.

Renan avalia que quanto mais a DPCE tiver ao seu lado a sociedade civil mais, mais força terá. Ele pertence à primeira geração de defensores com esta nomenclatura (antes, eram advogados de ofício) e afirma que a Defensoria colabora com a luta contra a necropolítica, um jeito de gerir o poder público que privilegia determinadas populações em detrimento de outras. Ou seja: os governantes decidem quem vive e quem morre, simbólica e fisicamente.

Por isso, ele afirma que os primeiros 25 anos da Defensoria, o Jubileu de Prata, são um marco fundamental à democracia. “E algumas coisas nos diferenciam de outras defensorias. Nós temos uma ouvidoria externa, parcerias com a sociedade civil, núcleos especializados com abertura para demandas da sociedade e tantas outras iniciativas importantes! Eu não vejo como a Defensoria pode se estabelecer dentro de um cenário político e social se não for assim. Porque se não for assim ela vai negar a própria existência. Nosso poder de barganha é a força da sociedade civil. É a sociedade civil quem tem que gritar pela Defensoria”, sintetiza.