Defensoria atua e liberta mulher que denunciou violência doméstica e acabou presa
Uma mulher presa ilegalmente foi solta após atuação da Defensoria Pública do Ceará (DPCE). Vítima de violência doméstica, ela acionou a Polícia, teve a integridade resguardada e, ao chegar à delegacia, terminou detida após os agentes de segurança constatarem a existência de um mandado em aberto no nome dela.
A guia de prisão de fato existia. Contudo, contrariava a Resolução nº 474/2022 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que determina a obrigatoriedade de a pessoa primeiro tomar conhecimento da decisão, o que não ocorreu. E foi exatamente este o argumento apresentado pelo defensor Jorge Bheron Rocha, atuante no Núcleo de Apoio ao Preso Provisório e às Vítimas de Violência (Nuapp) da DPCE, para a mulher ser solta ainda na audiência de custódia.
Ela havia sido processada em 2015 e condenada a dois anos e 11 meses de prisão em regime semiaberto. No entanto, a pena foi convertida em restrição de direitos em regime aberto e executada somente cinco anos depois, em 2020. Nesse intervalo de tempo, a mulher mudou de endereço. Deixou Itaitinga para morar em Caucaia, município distante cerca de 50 quilômetros de onde vivia e pertencente a outra comarca.
Por não acompanhar a evolução do processo e não ter comunicado à Justiça a mudança no endereço, acabou não recebendo a intimação sobre a pena, o que fez o juiz expedir mandado de prisão por pena definitiva sobre o qual a mulher só tomou conhecimento na Delegacia de Caucaia, quando chegou na condição de vítima de violência doméstica.
“Verifiquei que o mandado de prisão contrariava um entendimento atual do CNJ. Não cabe prender primeiro a pessoa quando ela está em regime aberto. Ela tem que ser primeiro intimada, e o Judiciário tem outras formas de localizar a pessoa, além de ter que passar por uma audiência admonitória, onde o juiz explica as medidas que devem ser cumpridas sob pena de regressão de regime. O promotor se convenceu dos meus argumentos, mudou o posicionamento e o juiz deferiu nosso pedido pela liberdade da assistida”, pontua Jorge Bheron Rocha.
A mulher foi, então, liberada mediante uso de tornozeleira eletrônica. Assim, não teve o desfecho de terminar o dia em que sofreu uma agressão, presa. E mais importante: teve a chance de voltar pra casa, pra perto dos filhos e pro trabalho.
“Nós entendemos que o juiz da audiência de custódia pode ir além de chancelar a prisão e decidir, sim, pela liberdade. Mas esse caso chama atenção porque além da compreensão dessa resolução do CNJ, que altera a forma de decidir nos processos e até o STJ já decidiu nesse sentido, nós precisamos considerar a perspectiva de gênero não só quando a pessoa é vítima. É preciso levar isso em consideração em qualquer situação, esteja ela como vítima, testemunha ou até mesmo como acusada. Não é só julgar sob perspectiva de gênero. É também defender sob perspectiva de gênero”, acrescenta Bheron.