Posso ajudar?
Posso ajudar?

Site da Defensoria Pública do Estado do Ceará

conteúdo

Pauta socioambiental domina audiência da Defensoria em Limoeiro do Norte

Pauta socioambiental domina audiência da Defensoria em Limoeiro do Norte

Publicado em

“Lutar e resistir pela Chapada do Apodi.”
“Lutar e resistir pela Chapada do Apodi.”
“Lutar e resistir pela Chapada do Apodi.”

O grito cadenciado e o punho em riste dos ativistas socioambientais do Vale do Jaguaribe marcaram a primeira audiência pública do Orçamento Participativo da Defensoria este ano. O encontro aconteceu nessa quinta-feira (17/3), no auditório da Faculdade de Filosofia Dom Aureliano Matos (Fafidam) da Universidade Estadual do Ceará (Uece) em Limoeiro do Norte, e teve como foco principal demandas de preservação da natureza, desenvolvimento econômico e maior atenção às populações afetadas pelo agronegócio.

A defensora pública geral Elizabeth Chagas prestigiou a atividade, que classificou como “uma oportunidade de construir nossas prioridades com vocês e a partir do que vocês precisam. Porque a Defensoria precisa estar próxima da população, ouvir, pegar todas as demandas e fazer algo com elas. Nós existimos por vocês. Estamos aqui por cada um de vocês.”

Ela enalteceu a resiliência dos membros do Acampamento Zé Maria do Tomé, presentes à audiência em busca de apoio. “Já estive lá e posso dizer que vi coisas lindíssimas. Tudo o que vocês falaram, eu vi pessoalmente. Vamos pensar na melhor forma de apoiarmos a comunidade”, acrescentou Elizabeth Chagas.

Moradora do Acampamento, Mônica Oliveira denunciou o risco de dezenas de famílias serem removidas do espaço, ocupado há oito anos depois de o líder da comunidade ser assassinado em meio a uma luta pública contra o uso de agrotóxicos. Segundo ela, a desocupação pode acontecer a partir do dia 31 deste mês, quando encerra o prazo estipulado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) de proibição à realização de despejos no Brasil.

A região é muito visada pelo agronegócio. “O que vai ser das famílias? Pra onde nós vamos? Só estamos reivindicando terra pra morar e produzir. Mas podemos, a qualquer momento, perder tudo o que a gente tem, que é só o acampamento. Se o acampamento for despejado, muitas famílias não têm pra onde ir nem como sobreviver”, alertou.

Seja pela voz de representantes de instituições ou no posicionamento individual de moradores, as denúncias socioambientais abrangeram diversas localidades do Vale do Jaguaribe. “Os conflitos socioambientais aqui afetam cada vez mais categorias. Precisamos olhar para os catadores, que vão ser afetados com o fechamento dos lixões. Essas famílias colocam alimento dentro de casa a partir desse trabalho. Tivemos aqui também uma expansão do agronegócio desde 2020 e essas empresas estão envenenando as famílias. Temos uma chapada com terra e água, mas também com famílias que moram e se constituíram lá”, afirmou a representante da Cáritas Diocesana em Limoeiro, Anjerliana Souza.

Ex-presidente do Comitê de Bacias Hidrográficas do Baixo Jaguaribe, José Maria de Andrade afirmou que várias pessoas estão ameaçadas de morte por conta das disputas socioambientais da região. “Eu mesmo fui ameaçado diversas vezes pelo agronegócio. Sou veementemente contra o agronegócio porque ele destrói a vida das pessoas, a vida da água e destrói o solo.”

Segundo a representante da Associação Unidos para o Progresso de Limoeiro, Francisca Francineide, diversas construções estão sendo edificadas nas matas ciliares dos rios do Vale do Jaguaribe, o que configura crime ambiental. “Há um descuido e um descaso, uma falta de proteção ao meio ambiente. Os ribeirinhos, os rios, não estão sendo respeitados”, disse, complementada pela representante do Movimento de Mulheres do Vale, Damiana Bruno: “precisamos denunciar o desmando do agronegócio na Chapada. As empresas querem desconstruir uma história construída há vários anos e por várias mãos. Se as famílias do acampamento forem despejadas, o que vai acontecer com elas? Onde vão viver? De que vão viver? E como vão viver?.”

Daniel Lemos, da Escola Família Agrícola Jaguaribana, classificou o contexto do Vale como “um problema além do ambiental, de saúde pública, porque vem ameaçando a vida das pessoas”. E isso ele atribui ao avanço do agronegócio, sobretudo na Chapada do Apodi e no perímetro do município de Tabuleiro do Norte. “Existe um uso abusivo de agrotóxico lá. A população, num raio de mais de cinco quilômetros, já vem sentindo o cheiro desse veneno dentro de casa”, revelou.

Para o integrante do Movimento 21, Reginaldo Ferreira de Araújo, “o problema ambiental aqui só tende a aumentar”. Ele denunciou o fato de todas as empresas em funcionamento hoje na chapada estarem com documentação irregular. “Tem estudo que comprova. Então, por que essas empresas, que estão lá especulando terra, não saem e o acampamento, formado por famílias que produzem alimentos, tem que sair? Não pode esses empresários virem aqui e envenenarem a nossa terra.”

Já o professor universitário João Rameres Regis enalteceu o fato de uma das propostas do Orçamento Participativo da Defensoria ser a criação de um grupo de trabalho só para lidar com conflitos ambientais. “Essa região é um celeiro de violação de direitos no tocante às questões ambientais. Essas violações são constantes e estão associadas a um grande interesse do capital porque a região é rica em água e é rica em solo. Mas é rica também em vida, em comunidades, que são destruídas quando esses projetos chegam aqui. Então, entendemos ser necessária a atuação da Defensoria para os vulneráveis e vítimas das opressões.”

Assessora de Relações Institucionais da DPCE, a defensora Lia Cordeiro Felismino avalia a ampla participação popular da primeira audiência do Orçamento Participativo. “A gente contou com a presença de diversas representatividades de movimentos sociais da região. Nós já imaginávamos que essa seria uma das pautas mais tratadas, pelas características próprias do Vale do Jaguaribe. Foi um momento extremamente rico, de escuta e de debate. Nós teremos outras audiências em outras cidades e esperamos que a população também participe. É um momento importante para a Defensoria tomar conhecimento das particularidades das demandas de cada região e possa transformar essas sugestões em políticas públicas.”

Coordenadora da Promoção da Igualdade Racial do Governo do Estado, Martír Silva prestigiou a audiência pública e classificou o momento como “um processo extremamente importante para sociedade e para quem precisa de acesso à justiça”. Ela enalteceu que o acesso à Justiça não se faz apenas com a ampliação de estruturas. “É preciso transformar o direito formal num direito efetivo, prático, que repercute na vida das pessoas nas suas condições de gênero, geração, raça e etnia. Todas essas questões nos colocam como sujeitos e sujeitas de direitos. E muitas vezes direitos fundamentais só são efetivados com a atuação da Defensoria. Pras pessoas racialmente excluídas, essa importância ganha uma dimensão muito maior. Porque quanto mais profunda a desigualdade, maior a necessidade de acesso à justiça.”

SERVIÇO
Até o fim de maio, a Defensoria vai promover outras cinco audiências públicas do OP em macrorregiões do Ceará, sendo a próxima já no dia 22 de março. Em todas, os participantes debaterão temas da realidade local e definirão as demandas e projetos prioritários da DPCE para o próximo ano. Confira o calendário completo das atividades:

SERTÃO DE SOBRAL, LITORAL NORTE E SERRA DA IBIAPABA
QUANDO: 22 de março, das 13 horas às 17 horas.
ONDE: Sede da Defensoria (avenida Monsenhor Aloísio Pinto, nº 1.200, no Dom Expedito, em Sobral).

CARIRI E CENTRO SUL
QUANDO: 7 de abril, das 13 horas às 17 horas.
ONDE: auditório da Universidade Regional do Cariri (rua Coronel Antônio Luiz, nº 1.161, no bairro do Pimenta, em Crato).

SERTÃO CENTRAL E SERTÃO DE CANINDÉ
QUANDO: 20 de abril, das 13 horas às 17 horas.
ONDE: Escola do Campo Filha da Luta Patativa do Assaré (assentamento Santana da Cal, no distrito de Bonito, em Canindé).

SERTÃO DOS INHAMUNS E SERTÃO DE CRATEÚS
QUANDO: 12 de maio, das 13 horas às 17 horas.
ONDE: Cáritas Diocesana de Crateús (rua Frei Vidal da Penha, nº 1.605, no São José, em Crateús).

GRANDE FORTALEZA, LITORAL LESTE E MACIÇO DE BATURITÉ
QUANDO: 28 de maio, das 13 horas às 17 horas.
ONDE: Centro Cultural do Bom Jardim (rua 3 corações, nº 400, no Bom Jardim, em Fortaleza)