
Última audiência do OP é marcada por pauta racial e pedidos por melhorias nos sistemas carcerário e socioeducativo
Iniciadas em março, as audiências públicas do ciclo do Orçamento Participativo deste ano da Defensoria Pública do Ceará (DPCE) encerraram nesta quarta-feira (24/5). O encontro aconteceu no campus da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-brasileira (Unilab), reuniu moradores e lideranças do Maciço do Baturité, Litoral Oeste e Grande Fortaleza e foi marcado pela pauta racial e por pedidos de melhorias no sistema carcerário.
A defensora geral Elizabeth Chagas acompanhou toda a discussão e tomou nota de todas as propostas, enaltecendo o quão fundamental é a participação da sociedade civil nas decisões e atividades da DPCE. “Nós não pautamos vocês. Vocês nos pautam. Porque as pessoas são a razão de existir da Defensoria. Sem as pessoas, não existe Defensoria. E nada substitui o olho no olho. É o que faz o diferencial”, afirmou, respondendo uma a uma as colocações feitas.
A integrante da Rede Nacional de Feministas Antiproibicionistas (Renfa), a professora Maria Elcelane Linhares, conhecida como Aninha, propôs à DPCE a promoção de ações sistemáticas de combate ao racismo. “A Defensoria tem que lançar mais energia e investimento na questão da igualdade racial. E não só com formações e palestras. Criar um núcleo de igualdade racial é importante para tratar não só de casos individuais, mas do racismo como algo estrutural. Porque o racismo é a base de opressão para outras questões, precisa de contrapontos à altura e todos nós sabemos que vivemos uma situação de seletividade penal e de promoção de violência nos territórios.”
Um desses episódios foi retratado por Laudenir Gomes. Ele mora em Redenção e afirmou serem recorrentes abordagens policiais de forma ostensiva e cujo público preferencial é o cidadão negro e morador de periferia. “Há muito racismo na região. A Polícia tem que vir pra nos dar segurança, mas a sensação que eu tenho é a de que nosso senso de insegurança aumenta. Há quase um toque de recolher”, disse, complementado por duas mães que trouxeram relatos sobre a passagem dos filhos pelo sistema socioeducativo.
Elizabeth Lima foi uma delas. A mulher teve o filho recolhido a uma unidade socioeducativa por cometer ato infracional e, após sair da custódia do Estado, acabou assassinado. “O socioeducativo e a cadeia não ressocializam coisa nenhuma! Tem demora no julgamento dos casos e aqui fora os territórios são tudo comandado por facções. A gente vive aflita”, afirmou.
Professoras da Unilab pediram apoio da Defensoria nas articulações para o município receber o hospital universitário projetado pelo Governo para o Maciço de Baturité. As docentes acreditam que por ser uma cidade universitária, Redenção teria melhores condições de manter o equipamento, inclusive na perspectiva da mão de obra. “Nós vamos iniciar em breve a formação de médicos e já temos curso de Enfermagem. Seria importante o hospital vir pra cá, mas também precisamos olhar para problemas como a especulação imobiliária, que aqui é muito forte”, afirmou a professora Larissa Nicolete.
Também docente da Unilab, a professora Luma Andrade preside o Instituto de Humanidades, o maior da instituição, enalteceu a importância de a audiência do OP acontecer no Maciço. “O Ceará não se resume a Fortaleza. É muito simbólico estar aqui, em Redenção, e aqui, na nossa universidade”, afirmou ela, primeira travesti doutora do Brasil.
Além de sugerirem diretamente à Defensoria Geral, os presentes à audiência indicaram quais devem ser as prioridades de atuação da instituição para o próximo ano. As indicações que compõem o questionário foram feitas pela população do Ceará como um todo no início do ano, quando a DPCE abriu consulta pública no site oficial que mantém na Internet e coletou as propostas.
Prestigiaram a audiência: a assessora de Relacionamento Institucional da DPCE, defensora Lia Felismino, o defensor Luís Fernando de Castro (representando a Corregedoria), a defensora Karinne Matos, a presidenta da Associação de Defensoras e Defensores Públicos do Ceará (Adpec), Kelviane Barros, e o ouvidor geral externo da Defensoria, Alysson Frota.