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“A solução não é destruir as políticas afirmativas. É ajustar”

“A solução não é destruir as políticas afirmativas. É ajustar”

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A tarde do primeiro dia do seminário “Políticas afirmativas e cotas raciais: o papel das comissões de heteroidentificação”, ocorrido nesta sexta-feira (5/8), foi marcada pelas palestras do professor, militante do Movimento Negro e mestre em História, Hilário Ferreira, e da professora, feminista e coordenadora especial de Políticas Públicas para a Promoção da Igualdade Racial da Secretaria da Proteção Social do Estado, Martír Silva.

Hilário falou sobre “Mestiçagem e população negra no Ceará”, enquanto Martír discutiu “Políticas Públicas de Promoção de Igualdade Racial no Enfrentamento do Racismo Estrutural”. “Existe uma história silenciada. Branquitude é um lugar de vantagem estrutural do branco. O racista não espera que o negro reaja. Ele subestima o outro. Então, não existe melhor forma de manipulação do que a ignorância”, contextualizou o professor.

O historiador alertou para fraudes que ocorrem em processos seletivos com vagas destinadas a pessoas negras por haver uso indevido do conceito do que é ser pardo no Brasil. Pela classificação do IBGE, a população negra brasileira é composta por indivíduos pretos e pardos. O instituto considera os critérios cor/raça na autoidentificação. “Brancos não podem utilizar as cotas como um caminho fácil. A política de cotas é para negros. Existe um nível de ações ridículas, subestimando as pessoas que estão na banca. Sempre vão existir problemas, mas a solução não é destruir as políticas. É ajustar. Eu posso ser a pessoa que pode ajudar. Eu defendo o negro e o negro de pele clara. Estamos na luta”, disse ele.

Já Martír Silva afirmou que as cotas existem há apenas dez anos, quando o processo de subjugação do povo negro no Brasil data de mais de cinco séculos, processo esse que ela classificou de “negação da humanidade”, de direitos, de negação de oportunidades. A secretária enalteceu as políticas de igualdade racial do Ceará, um estado que historicamente nega a existência da população preta e parda e alimenta o mito de ter uma ascendência europeia, por mais que registros históricos comprovem nossa origem africana.

“Enquanto essas políticas de cotas são recentíssimas, é preciso que a gente veja de onde vêm nossos passos na luta. Não podemos falar dos dias correntes sem falar do nosso passado, do trabalho de milhões de pessoas escravizadas para a mercantilização global. Esse é um debate tão essencial e de um alcance maior do que a nós mesmos. Precisamos falar para as instituições, para o estados e sociedade como um todo, assim como a nós mesmos. Todo momento é momento de resistência e afirmação”, afirmou.

Após a abolição, em 13 de maio de 1888 e, no Ceará, em 1884, iniciou-se, conforme Martír, uma construção racista e antinegro. A reflexão feita pela coordenadora especial traduziu a tentativa histórica de reduzir a presença da população negra no país. “Como nós chegamos no Século XXI com ausência significativa de pessoas negras nas instituições públicas e privadas, onde se produz e reproduz os saberes e os poderes, o conhecimento e as decisões? Como chegamos a isso? O racismo institucional é resultado da construção do nosso país. O combate ao racismo é fundamental para a garantia de todos”.

A secretária enalteceu que as ações afirmativas desempenham papel importante no combate à desigualdade social e às segregações por permitirem que pessoas de origens distintas alcancem espaços de influência no âmbito educacional, político, econômico, socioprofissional e cultural.

O seminário “Políticas afirmativas e cotas raciais: o papel das comissões de heteroidentificação” continua na próxima sexta-feira (12/8), com outras três palestras marcando a programação. O seminário é gratuita e fruto de parceria entre a Escola Superior da Defensoria Pública (ESDP), Escola Superior da Magistratura do Estado (Esmec, do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE)), Escola Superior do Ministério Público do Ceará (ESMP) e Centro de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional (Ceaf, do MPCE).