“Agora, realmente, eu faço parte da família do meu pai”
A manhã do último sábado (12) foi marcada por muita emoção para quem acompanhou o mutirão da Defensoria Pública do Estado do Ceará (DPCE) “Meu pai tem nome”, de reconhecimento de paternidade. A ação, promovida nacionalmente pelo Conselho Nacional das Defensoras e Defensores Públicos-Gerais (Condege), reuniu mais de 200 famílias nas cidades de Crato, Fortaleza e Sobral que buscam inserir o nome do pai no espaço vazio não só na certidão de nascimento, mas na história de vida de tantas crianças, adolescentes e adultos.
Antônio Carlos Araújo, de 42 anos, esteve com a mulher para ajustar a certidão de nascimento do filho, de nove anos. Ele é o pai biológico do menino, mas não o registrou quando a criança nasceu porque não tinha documentos. Por isso, Davi carrega apenas informações sobre a mãe, Francisca Andrelina. Só agora Carlos conseguiu ajustar a situação e aproveitou o mutirão para colocar o nome dele na certidão de nascimento de Davi. A esposa está grávida de cinco meses do segundo filho e foi impossível não se emocionar com os olhos marejados de todos.
“Agora, realmente, eu faço parte da família do meu pai”, comemorava Davi, arrancando lágrimas de todos que acompanhavam a família. A mãe conta que pai e filho nunca ficaram longe um do outro e achava que era complicado resolver a documentação. “Foi super rápido. Já saímos com o encaminhamento diretamente para o cartório arrumar isso. Agora é só ir lá. Vou resolver isso o quanto antes”, complementou.
É o caso de Rose Maria* que também procurou a Defensoria para resolver o imbróglio do filho, de cinco anos de idade. Quando a criança nasceu, o pai ficou com receio de ir ao cartório porque estava respondendo a um processo judicial. E quem acompanhou a mãe do garoto foi o avô paterno, que o registrou como filho. “O pai biológico sempre reconheceu e conviveu com a criança como filho, mas estava com medo de ir ao cartório e ficar preso. Para o filho não ficar sem pai no documento, a família registrou no nome do avô. Entramos com uma ação judicial pedindo a impugnação de paternidade com investigação de paternidade”, explica a defensora pública Anna Kelly Nantua, que atendeu a família.
A busca pelo nome do pai nos documentos não se restringe a crianças. No caso de Juliana Silva, 37, e Junior Silva, 40, a falta persiste há décadas. Apesar deles e do irmão mais novo conviverem durante toda a vida com o pai, o genitor nunca os reconheceu oficialmente. Os irmãos conviveram com o pai durante toda a infância e adolescência, viajavam para a casa do interior, conviviam com os outros irmãos, mas o reconhecimento formal da paternidade era uma sombra.
“Nunca partiu dele essa vontade. Esperei 40 anos e ele nunca teve iniciativa. A gente viu o mutirão na televisão e resolveu dar início. A minha mãe morreu há dez anos e era um desejo dela. Ele não veio, mas espero que ele tenha boa vontade para encerrar esse ciclo e reconhecer paternalmente perante a justiça. Estamos atrás do nosso direito”, conta o filho.
Eles deram entrada na ação judicial de reconhecimento de paternidade. Assim, foi feita uma petição chamando o pai a realizar o exame de DNA. Nessa situação, acontece ainda a audiência de conciliação e o pai também pode ser reconhecido voluntariamente. Se ele não reconhecer ou não realizar o exame, será intimado a fazer o teste.
As histórias de Davi, Júnior e Juliana coincidem com a de milhares de brasileiros, como as de 167.420 crianças nascidas no ano passado que não receberam o nome do pai no registro de nascimento. Mutirões como o do Dia D são esforços para diminuir esses números.
No Ceará, 715 pessoas se inscreveram para o projeto “Meu pai tem nome”. Além de audiências para reconhecimento voluntário da paternidade, a força-tarefa atendeu situações sem acordo entre as partes, cujos pais recusaram-se a registrar o(s) filho(s) e, por isso, foi necessário a realização de exame de DNA.
“Esse momento é de identidade que impacta de forma direta não somente na questão material mas, sobretudo, na parte emocional na vida de quem tem pai ausente no registro. É a forma de oportunizar esse reconhecimento de pertencer a uma família, de ter uma história, de ter uma família paterna. A gente faz esse atendimento durante todo o ano, mas o Condege concentrou esforços neste dia D em mutirão. Por conta da alta demanda, com certeza vamos replicar a ação nos próximos meses. É uma felicidade estar aqui e poder oportunizar às pessoas uma transformação na vida delas”, disse a defensora pública geral Elizabeth Chagas.
Confira abaixo as imagens da ação: