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Como cobrar a pensão alimentícia atrasada em tempos de isolamento social

Como cobrar a pensão alimentícia atrasada em tempos de isolamento social

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Os questionamentos chegam todos os dias:

“Sou pai e estou desempregado, devo pagar a pensão mesmo assim?”
“Como posso cobrar o pagamento da pensão em atraso para os meus filhos?”
“O pai não me ajuda em nada. Posso pedir a pensão na justiça?”
“Se eu não pagar, o que acontece?”
“Posso pagar após a data do vencimento?”
“Como renegociar o valor estabelecido se tive redução salarial?”

Os impactos econômicos ocasionados pelo novo coronavírus (Covid-19) têm provocado dúvidas quando o assunto é: cobrança de alimentos –  uma ação judicial recorrente nos atendimentos da Defensoria Pública do Estado e que realiza a execução de valores não pagos da pensão alimentícia, a fim de garantir o acesso aos proventos necessários para o custeio de necessidades básicas da criança como: roupas, alimentação, remédios, material escolar, etc.

Em 2019, foram 3.228 peticionamentos por meio da Defensoria Pública referentes à demandas de alimentos – dos quais 1.962 são de pedidos de fixação de pensão alimentícia e 1.266 de cobrança do pagamento da pensão. A paridade dos dados demonstra que mesmo tendo a definição da prestação de alimentos, a efetivação desse direito de forma contínua ainda é um desafio.

O fato é que, após uma decisão ou um acordo extrajudicial fixando alimentos, o não cumprimento da responsabilidade poderá resultar na cobrança. A partir do vencimento de uma prestação o ajuizamento da execução já pode ser feito, conforme explica a defensora pública titular da 8a Defensoria do Núcleo de Atendimento e Petição Inicial de Fortaleza (Napi), Sâmia Costa Farias Maia. “Havendo o atraso no pagamento da pensão estabelecida, o devedor poderá ser demandado judicialmente independente do período de isolamento. Com o descumprimento, o beneficiário dos alimentos ou o seu responsável, caso se trate de criança ou adolescente, deve procurar a Defensoria Pública para ajuizar os pedidos cabíveis”, ressalta.

A defensora pública esclarece ainda que se o débito for referente aos três últimos meses, será possível pedir a prisão civil do devedor. “Em virtude da pandemia, as prisões em regime fechado estão suspensas para evitar as aglomerações, no entanto, continuam sendo decretadas. Nesse caso, o alimentante poderá ter  prisão domiciliar ou até mesmo a determinação para cumprimento em regime fechado após a normalização do isolamento. Já os débitos mais antigos poderão ser cobrados através de execução pela via da penhora de bens, do parcelamento por desconto em folha e ainda negativação de seu crédito e outras vias coercitivas previstas na lei”, afirma a defensora.

O trabalho como entregadora de uma lanchonete foi a solução encontrada por Rafaela Oliveira, 30 anos, para conseguir garantir o sustento da filha diante das dificuldades financeiras decorrentes do cenário atual. Ela está desde o começo do ano sem receber pensão e agora quer conseguir a regularização dos pagamentos. “Dei entrada no pedido de pensão em 2018 e resolvemos de forma amigável. No começo deu tudo certo, os pagamentos eram feitos nas datas corretas e sem atrasos. Em 2019, já teve um atraso de três meses, mas depois restabeleceu, mas ele não pagou os pendentes. Apesar das dificuldades, preferi não ir atrás. Aí agora, de novo. Desde o início do ano, a pensão da minha filha não é paga e, dessa vez, não deixei para lá, dei entrada e estou aguardando o encaminhamento”, desabafa a mãe, que segue esperançosa no desfecho positivo. “Não vou mais deixar de buscar garantir os direitos da minha filha. é preciso que as pessoas compreendam que ter filhos é ter responsabilidades para vida toda”, diz.

A defensora pública que atua na 8º Defensoria de Família, Nelie Aline Saraiva Marinho, afirma que as demandas relativas aos pedidos de cumprimento de sentença fazem parte da rotina diária e destaca que o estado de pandemia atual não anula a responsabilidade em relação a pensão alimentícia. “É importante separar as situações, pois a condição de isolamento não libera o alimentante do seu compromisso, assim como já é sabido que o desemprego nunca foi considerado uma justificativa. A criança deve permanecer amparada para garantia de seus direitos. Se o que ficou determinado não está sendo cumprido a cobrança deverá ser feita, afinal tanto a responsabilidade financeira da pensão quanto às penalidades provenientes do descumprimento continuam em vigor”, explica.  Ela alerta ainda que a rotina de audiências das Defensorias de Família retomam na próxima semana, por plataforma virtual, a partir do dia 5 de maio e voltando à normalização de todos os prazos – exceto dos processos físicos. “Estamos atendendo normalmente, só que em regime de teletrabalho”, pontua Nelie Aline Saraiva Marinho.

A revisional de alimentos

Caso existam dificuldades para honrar com as obrigações assumidas, é preciso buscar negociá-las, mas nunca deixar de realizar o pagamento para que o beneficiário não seja prejudicado. A defensora pública, Emanuela Vasconcelos Leite, alerta que o devedor de pensão precisa ter atenção quanto aos pagamentos em atraso para evitar consequências judiciais. “O devedor de pensão alimentícia, que tem uma sentença que lhe obriga a pagar uma determinada quantia em dinheiro ao seu filho ou filha, não deve simplesmente deixar de pagar, pois isso pode gerar consequências de ordem judicial como penhora de bens ou valores, negativação no SPC\Serasa, acúmulo de juros e até mesmo a prisão”, esclarece a Emanuela Leite.

O valor de 50% do salário mínimo foi fixado em juízo para que Márcio Roger Silva, 42 anos, porteiro, pague ao filho do primeiro casamento e ele vem honrando este valor há 18 anos, mas, de um mês para cá, a situação apertou. Ele procurou a Defensoria Pública, por meio do atendimento remoto para pegar orientações de documentos e saber como proceder para dar entrada na revisional de alimentos. “Ao longos desses 18 anos sempre honrei com os pagamentos da pensão, tive alguns atrasos, mas sempre me esforcei ao máximo para colocar em dia, pois bem entendo o meu compromisso”, diz. Ele alega que a condição de isolamento outras contas aumentaram em casa. “Atualmente sou casado, tenho outras duas filhas menores e com essa condição de isolamento tive aumento dos gastos, das contas e não estou conseguindo arcar com tudo. Infelizmente tá complicado conciliar todos pagamentos com a minha renda mensal de R$ 1.400,00. Vou reunir a documentação para o andamento desse processo, pois quero fazer tudo da maneira correta, dentro da lei, para não prejudicar o meu filho e nem a mim”, afirma.

Para isso Márcio, que é o alimentante, terá que pedir a justiça e provar a necessidade desta redução. “A comunicação é essencial para que situações como essa possam ter a melhor solução. Então, havendo possibilidade de diálogo, sugerimos que o devedor de pensão procure o credor – que é o representante do menor, da criança ou adolescente – e tente negociar uma outra forma de efetuar o pagamento dessa pensão com algum outro item que a criança esteja precisando nesses dias de isolamento social. Havendo um consenso entre as partes é possível realizar a formalização do que ficou definido e resguardar as partes. Mas, se não houver nenhum acordo, o devedor deverá entrar em contato com a Defensoria Pública pelos canais de atendimento remoto e pegar as orientações acerca da documentação necessária para que seja dada entrada na revisional de alimentos – ação que, a partir da comprovação de redução efetiva de renda, poderá rever o valor de pensão fixado, frisa a defensora pública.