Posso ajudar?
Posso ajudar?

Site da Defensoria Pública do Estado do Ceará

conteúdo

Cuidar do idoso é dever da família, da sociedade e do Estado

Cuidar do idoso é dever da família, da sociedade e do Estado

Publicado em
TEXTO: SAMANTHA KELLY, ESTAGIÁRIA SOB SUPERVISÃO
ARTE: VALDIR MARTE

A Defensoria divulga, a partir de hoje, uma série de matérias de temas que tiveram muita visibilidade no site no ano de 2024. A responsabilidade sobre idosos é um dos temas mais acessados  

O Brasil está envelhecendo. A expectativa de vida no país já alcança uma média de 76 anos, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Com isso, crescem também os desafios de assegurar cuidado e proteção às pessoas idosas, o que, segundo a Constituição Federal e o Estatuto do Idoso, é um dever compartilhado entre família, sociedade e Estado. 

Em Fortaleza, o Núcleo Especializado no Atendimento à Pessoa Idosa da Defensoria Pública do Estado (DPCE) atende diariamente idosos que, mesmo em situações diversas de autonomia ou dependência, recorrem ao apoio jurídico para garantir seus direitos. As demandas mais comuns incluem inventários, usucapião, interdições, curatelas, guarda, reparação de danos e divórcios. No ano passado, o Núcleo registrou 23.170 procedimentos em relação aos idosos, quase o dobro do ano anterior. No interior do Ceará, as sedes da Defensoria recebem demandas de toda ordem envolvendo pessoas idosas.

Os relatos de idosos que buscam assistência mostram realidades distintas: enquanto alguns mantêm autonomia, outros dependem completamente de familiares ou terceiros para suas necessidades básicas. Um exemplo de como essas relações podem funcionar de forma saudável é o da aposentada Albanita de Oliveira Silva, de 76 anos. Ela vive de forma independente e mantém uma rotina ativa, mas conta com o apoio de seu filho para questões práticas. “Meu filho tem a vida dele e eu tenho a minha, eu ainda faço tudo, cuido da minha casa, vou para aniversário e vou para a hidroginástica. Ele quer me ajudar, mas eu digo pra ele que não precisa, ainda posso fazer, mas ele que faz questão de fazer: marcar consulta, me levar pro médico, coisas assim”, relata.

O filho de Albanita, Emídio de Oliveira Silva reconhece a importância de respeitar a autonomia da mãe, mas vê como natural prestar suporte em certas situações. Ele explica que realiza o transporte de sua mãe para auxiliar ela em suas atividades do dia a dia e que tem uma procuração para receber os medicamentos de sua mãe na farmácia popular, mas, por exemplo, em questões financeiras sua mãe resolve de forma independente e ele apenas acompanha. “Eu levo ela, acompanho, mas ela resolve tudo e eu não me meto e não mexo em dinheiro.”

Por outro lado, há casos de abandono e que exigem maior intervenção. O casal de idosos Maria Lúcia Coelho, 70 anos, e Francisco Evaldo Coelho, 66 anos, procurou a Defensoria para buscar ajuda para um amigo de 82 anos que vive em condições de extrema vulnerabilidade. “Ele não tem família e a gente veio aqui para interceder por ele, tá acamado, como não tem ninguém, os amigos que ajudam ele. A gente tá atrás de ver se consegue um abrigo para ele, porque na situação que ele tá, só mesmo um abrigo público, porque ninguém tem condição de botar ele dentro de casa. Ele aluga um quartinho de uma casa que fica atrás. Mas é um quartinho muito precário, que nem uma janela tem. Só os amigos que ajudam ele”, conta Maria Lúcia.

Ela explica que, além das condições inadequadas de moradia, o amigo enfrenta dificuldades para acessar seu benefício. “O benefício dele era o BPC, então até novembro, quando ele ainda andava, a gente levava ele no banco para receber, mas agora está até difícil para pegar o dinheiro dele, porque ele agora não sai mais de casa”, completa.

A defensora pública Carolina Bezerril, titular do Núcleo Especializado no Atendimento à Pessoa Idosa, explica que o papel da Defensoria, nesses casos, é buscar soluções que garantam os direitos do idoso. “Primeiramente tentamos marcar uma mediação para conscientizar os envolvidos sobre a importância e deveres com o idoso, e caso não tenha êxito no acordo extrajudicial, ingressamos com a ação necessária para assegurar os direitos do idoso.” Em casos extremos de abandono e maus-tratos por essas serem questões criminais são de competência do Ministério Público do Estado (MPCE) e da Polícia Civil. Cabe ao familiar, amigo ou o próprio idoso buscar a delegacia especializada em Fortaleza.

Ela também reforça que o trabalho do Núcleo vai além das questões judiciais. “Nós atendemos todos os idosos com problemas jurídicos que precisem ser ajuizadas ações, bem como também tentamos solucionar por meio extrajudicial, se possível, com exceção das demandas da área de saúde e consumidor que têm os núcleos específicos na Defensoria na capital”, conclui. 

O defensor público Daniel Leão, supervisor do Núcleo, lembra a possibilidade de idosos solicitarem judicialmente ajuda financeira alimentar (pensão), prevista na Constituição Federal. É o princípio da solidariedade familiar. “Esse princípio é crucial e, em muitas ocasiões, é o que garante o amparo aos idosos em momentos de dificuldade”, destaca. O pedido de alimentos a terceiros precisa atender a três itens: necessidade, possibilidade e razoabilidade.  Ou seja: a necessidade de quem está solicitando, a possibilidade de pagar entre os responsáveis e uma proporção de que seja razoável e não prejudique a subsistência de nenhuma das partes. O entendimento jurídico é de que familiares têm a obrigação de prestar assistência financeira a parentes idosos em situações de vulnerabilidade.

Ao reforçar a importância do cuidado com os idosos, a Defensoria Pública chama atenção para uma realidade que não pode ser ignorada: envelhecer é uma fase da vida que exige apoio e respeito. Garantir o cuidado, não é apenas um dever constitucional, mas um compromisso ético com a dignidade humana, de família, da sociedade e do Estado.