Posso ajudar?
Posso ajudar?

Site da Defensoria Pública do Estado do Ceará

conteúdo

Defensoria discute “economia do cuidado” e inclusão escolar em seminário sobre demandas da população autista

Defensoria discute “economia do cuidado” e inclusão escolar em seminário sobre demandas da população autista

Publicado em
Texto: Bruno de Castro
Fotos: Fernanda Aparecida e Samantha Kelly, estagiárias em Jornalismo e sob supervisão

As defensoras públicas Michele Camelo e Mariana Lobo participaram nesta quinta-feira (11/4) do seminário “Autismo: valorize as capacidades e respeite os limites”. Composto de 13 painéis, o evento aconteceu em alusão ao mês – abril – no qual é comemorado o Dia Mundial de Conscientização sobre o Autismo (2/4). Todas as atividades foram realizadas no auditório da DPCE em Fortaleza.

Especialista em direito da família, Michele Camelo ministrou o painel “As perspectivas da sobrecarga feminina na maternidade neurodivergente”. Pautou, assim, o debate sobre “economia do cuidado”, contexto de trabalho não remunerado no qual enquadram-se muitas mulheres com filhos atípicos/neurodivergentes – como são chamados os indivíduos diagnosticados com Transtorno do Espectro Autista (TEA).

Estima-se que o Brasil tenha atualmente cerca de seis milhões de pessoas com autismo. “Essa mãe neurodivergente precisa de suporte. Mas muitas não têm rede de apoio. Como nossa cultura é patriarcal, isso tem um custo, inclusive econômico. Então, a gente precisa que a Justiça dê uma resposta a essas mulheres, pois tem se tornado cada vez mais frequente a presença delas nos nossos atendimentos”, afirmou Michele Camelo.

A defensora afirmou que o Judiciário brasileiro tem dado demonstrações de compreender a importância da causa quando produz sentenças que consideram a realidade de maternidades neurodivergentes, como tem acontecido ultimamente. Para ela, diante de pesquisas que indicam que 42% das mulheres abdicam da própria carreira por causa da maternidade, o gênero precisa ser mais presente nas decisões judiciais familiares em geral – e mais ainda no tocante ao TEA.

 

“A maternidade impacta muito mais a vida da mulher do que a paternidade afeta a vida do homem. Tanto que muitas mulheres manifestam problemas de saúde mental devido ao acúmulo de tarefas que perfeitamente poderiam ser compartilhadas. Por exemplo: só 26% dos homens cozinham a própria comida. Quem faz a dos 74% restantes? Apenas 34% das guardas das crianças hoje são compartilhadas. Mas quantas são realmente compartilhadas? Porque o que vemos é uma sobrecarga para a mulher, em especial na gestão desse cuidado da família”, acrescentou Michele.

Ela alertou ainda que o recorte racial e de classe expõe a incidência de toda essa pressão principalmente sobre a mulher negra e periférica, que é justo o público mais recorrente das defensorias. Na DPCE, elas chegam a 70% dos atendimentos. “Pode soar um pouco forte o que vou dizer, mas a mulher nasce condenada ao amor materno. Mesmo que não seja mãe, pelas mais diversas razões, ela vai cuidar de alguém. O dever do cuidado foi imposto às mulheres. É dessa forma até hoje. Nós somos ensinados assim”, finalizou a defensora.

Já Mariana Lobo apresentou o painel “As perspectivas da inclusão escolar e a prática da Defensoria”, no qual enalteceu a referência internacional que é o Brasil enquanto legislação com vistas à inclusão de pessoas com deficiência, como são consideradas aquelas com TEA. Os desafios encontrados pela DPCE para a efetivação desses direitos, porém, foram elencados.

Questões como a garantia de vagas em escolas regulares, a presença de profissionais de apoio para o desenvolvimento do(a) aluno(a) e o desenvolvimento de um plano educacional individualizado de cada estudante, por exemplo, são recorrentes no Núcleo de Direitos Humanos e Ações Coletivas (NDHAC), do qual Mariana Lobo é supervisora e só no ano passado acompanhou 105 famílias de maneira integral quanto a demandas de educação.

“A Defensoria trabalha para garantir todos esses e vários outros direitos, porque hoje a gente compreende que, no caso das pessoas com TEA, não dá pra dissociar o acesso à educação do acesso à saúde, visto que essas pessoas têm que fazer uma série de tratamentos, acompanhamentos e terapias. No que diz respeito à escola, seja ela pública ou privada, nenhuma taxa pode ser cobrada a mais pelo fato de o aluno autista demandar profissionais de apoio”, alertou.

Para Mariana Lobo, mesmo com todas as deficiências, a rede pública atende relativamente aos estudantes com TEA porque “está mais preparada na compreensão de suas obrigações, apesar de ser deficitária no cumprimento delas”. A defensora acrescenta: “na rede privada, essa compreensão é próxima de zero. E é preciso entender que garantir acesso não é só reservar vaga pra pessoa autista. É assegurar a chegada dessa pessoa à escola e, sobretudo, o aprendizado.”

Com apoio da DPCE, o seminário “Autismo: valorize as capacidades e respeite os limites” foi promovido pela Associação Cearense de Defesa do Consumidor (Acedecon) e teve como objetivo combater a desinformação e o preconceito contra autistas, bem como conscientizar a população em geral sobre os direitos dos autistas.