Defensoria garante que mulher com autismo tenha autorização para cultivo doméstico da maconha para extração de óleo para tratamento
Texto: Samantha Kelly, estagiária em Jornalismo sob supervisão
Ilustração: Diogo Braga
A Defensoria Pública do Ceará (DPCE) garantiu na Justiça o direito de uma mulher cultivar maconha em casa para fins de extração de óleo medicinal. Na condição de pessoa com autismo, diagnosticada com Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) e ansiedade generalizada, ela necessita do canabidiol para tratamento prescrito por médico.
A assistida procurou a Defensoria porque precisava fazer uso regular da substância, cuja aquisição só era possível por meio de importação, com custos elevados. Ela necessitava, portanto, obter autorização para plantar e extrair o óleo em casa. Contudo, se o fizesse por conta própria, sem autorização da Justiça, mesmo com as recentes alterações na lei de drogas, poderia ser acusada e presa por tráfico.
“O STF [Supremo Tribunal Federal] fixou a quantidade máxima de 40 gramas de maconha para a caracterização do consumo. Ou seja: passando disso, será considerado, a priori, tráfico. Em casos como o da assistida, ela necessita de algo em torno de 80 a 100 gramas por mês para a extração da quantidade de óleo prescrita. Logo, mesmo com a descriminalização feita pelo STF, o salvo conduto obtido através da atuação da Defensoria continuava sendo necessário para que ela não venha a responder penalmente pelo cultivo e exploração terapêutica da cannabis”, esclarece o defensor público Alfredo Homsi, titular do Núcleo de Assistência ao Preso Provisório e às Vítimas de Violência (Nuapp).
Para ingressar com a ação, a assistida apresentou relatório médico, atestado e receituário que comprovam o diagnóstico e a necessidade do uso do canabidiol, já que a medicação convencional não surtia o efeito desejado e, com o óleo derivado da maconha, obteve significativa evolução, amenizando crises de convulsões, ansiedade, insônia, restrição alimentar, dentre outros sintomas, apresentados desde os 12 anos. Com toda a documentação reunida, a DPCE acionou o Poder Judiciário por meio de um Habeas Corpus de caráter preventivo.
“O óleo da cannabis mudou minha vida de um jeito inexplicável, como de diversas outras pessoas no Brasil e afora. Muitos casos começam de forma clandestina. Devido ao alto valor e à dificuldade de acesso, os pacientes começam de forma ilegal, mas observam que muitos dos sintomas têm uma melhora significativa. O estigma que se coloca em cima do uso da cannabis é desproporcional ao seu dano”, afirma.
À Justiça, o defensor público Alfredo Homsi alegou que o plantio da assistida, além de ser para fins medicinais ou científicos, aconteceria mediante fiscalização. “É preciso que o Estado do Ceará regulamente o cultivo e o processamento da cannabis para fins medicinais, nos casos autorizados pela Anvisa, a exemplo do que já ocorre em Pernambuco, Rio Grande do Norte e Paraíba. Até que isso ocorra, a via judicial tem sido o caminho mais viável para que pacientes de baixa renda tenham acesso a esse medicamento, que tem se mostrado eficaz para tratar e amenizar sintomas de diversas patologias”, afirma Alfredo Homsi.
Para a assistida, a autorização representa a segurança de fazer o tratamento que precisa sem a ameaça de ser acusada de cometer algum crime. Ela também declara que a descriminalização da maconha é necessária “para regularizar, baratear e facilitar o acesso aos benefícios da cannabis e também à redução de danos aos usuários recreativos, já que a proibição não faz com que não haja consumo e apenas gera poder ao tráfico e utilização desregrada”.