Posso ajudar?
Posso ajudar?

Site da Defensoria Pública do Estado do Ceará

conteúdo

Defensoria ingressa com ação inédita para alterar gênero de não-binárie; casos podem ser atendidos em mutirão nesta quinta (30)

Defensoria ingressa com ação inédita para alterar gênero de não-binárie; casos podem ser atendidos em mutirão nesta quinta (30)

Publicado em

A Defensoria Pública Geral do Ceará (DPCE) ingressou com ação inédita para mudar a certidão de nascimento de uma pessoa não-binárie. Brune Bonassi, de 29 anos, deseja tirar do documento o gênero feminino e ser tratade numa perspectiva neutra. Além disso, reivindica a exclusão do sobrenome materno.

Brune é psicanalista e diz que a relação com a família sempre foi conflituosa exatamente por questões relacionadas à identidade de gênero e à orientação sexual. E que ser obrigada a escrever o sobrenome lhe causa sofrimento psicológico. O contexto de violências fez nascer uma aversão ao vínculo familiar.

“Quando nasci, fui registrade com o nome de Bruna Camillo Bonassi. A minha família materna sempre foi muito machista e transfóbica. Por conta disso, o meu sobrenome materno me gera gatilho. Me sinto triste, ansiose e tenho náuseas toda vez quando tenho que assinar meu nome inteiro. Tive em minha vida um longo histórico de depressão, crises de ansiedades e pânico por conta dessa relação conflituosa e me afastei da minha família materna assim que pude, com 17 anos. Quando preciso entrar em contato, meu psicológico é severamente afetado”, narra.

Brune é natural de Santa Catarina, atualmente mora em Fortaleza e é casade com uma pessoa também não-binárie . Desde a infância, a psicanaliste diz que enfrenta diversos desafios por não conseguir se identificar com o gênero que lhe atribuíram no nascimento (feminino) e isso fez com que os conflitos com a família fossem ainda mais recorrentes.

“Durante a minha infância, sempre tive disforia com o feminino, com a minha própria imagem e eu não conseguia me identificar nem com o grupo das meninas nem com o grupo dos meninos. Sempre tive o costume de andar com cabelo amarrado, calça bem larga e isso gerava um estranhamento nas pessoas, uma vez que nasci em uma cidade do interior, onde tudo era muito tradicional e questões sobre sexualidade eram vistas com maus olhos. Sempre me diziam pra eu ser mais feminina”, diz.

 

 

Foi na adolescência que Brune começou a ter uma visão mais ampla sobre si. “Quando estava no ensino médio, comecei a me questionar e me descobri bissexual. Só que, mesmo assim, continuei a ter disforia, não me sentia bem com a minha imagem e não conseguia entender o que eu precisava fazer pra mudar. Foi durante o mestrado que tive acesso à noção de não-binaridade, conheci pessoas não-bináries e, a partir daí, comecei um processo de hormonização e consegui me ver de forma mais positiva”, comenta.

Em 2018, um importante passo: a mudança do nome. Deixou Bruna para trás e passou a ser Brune, com “e” (pronome neutro, nem masculino nem feminino). Porém, incluir o não-binárie nos documentos e fazer a exclusão do sobrenome materno – que causa sofrimento – ainda são passos importantes. Agora, esse sonho está prestes a ser realizado.

No início de junho de 2022, Brune procurou a Defensoria. O caso foi recebido pela supervisora do Núcleo de Direitos Humanos e Ações Coletivas (NDHAC), defensora Mariana Lobo. Essa é a primeira ação deste tipo na instituição. “É importante dizer que o direito constitucional livre da identidade de gênero é um direito fundamental assegurado na Constituição. Então, não há dissonância entre o nome e sexo atribuídos no momento do nascimento e a identificação da pessoa. Ou seja: nesses casos, deve prevalecer a autonomia de vontade e não há razão jurídica relevante para distinção entre o transgênero binário, cujo direito à alteração do prenome e o gênero, para um transgênero não-binário. Ou seja, não pode haver diferenciação para esses dois na inserção de gênero”, explica a defensora.

Mariana Lobo afirma ainda que o conceito de gênero deve ser visto pela perspectiva de como o indivíduo se identifica na sociedade. “O registro civil é referência a uma vontade e como essa pessoa se socializa. Por isso, se a forma que ela se socializa está diferente do gênero do nascimento, não tem por que não ser feita a alteração para o não-binarismo. Ou seja: sexo biológico e identidade de gênero são independentes; devemos respeitar a pluradidade de diversidades.”

MUTIRÃO TRANSFORMA
Em alusão ao Dia do Orgulho LGBT, celebrado mundialmente na última terça-feira (28/6), a Defensoria promove nesta quinta-feira (30/6) o Transforma, primeiro mutirão de mudança dos documentos de pessoas trans e travestis da DPCE. Solenidades acontecerão em Fortaleza, Sobral, na Região Norte, e Juazeiro do Norte, no Cariri, onde também haverá atendimento ao público que deseje solicitar alteração na certidão de nascimento.