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“Hoje tenho a minha identidade com o nome que eu tanto quis: Alexia”

“Hoje tenho a minha identidade com o nome que eu tanto quis: Alexia”

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“Alexia significa ajudante ou defensora da humanidade. É um significado bem simples, porém forte. E eu sempre botei na minha cabeça que no dia que eu conseguisse a retificação da minha certidão, o meu nome ia ser esse”. Fala como quem sonha, aos 34 anos, nascer de novo. E finalmente, nasceu com o nome que ela quis. O sonho antigo, lá da adolescência, concretizou-se na última semana, 10 anos depois, com muita luta e várias tentativas. Com o novo registro em mãos, celebra: “vou ter orgulho de andar com meu documento na minha mão. Quem ver? Sou Alexia Batista”. 

Em 2018, o processo para a alteração do registro civil de pessoas trans e travestis tornou-se simplificado sem a necessidade de dar entrada na justiça. Mas, para iniciar o processo administrativamente, a pessoa interessada deve reunir a documentação, procurar um cartório civil e efetuar o pagamento das taxas. E eis a dificuldade. Quem passou por uma vida de privações – que começam pela negativa da sociedade em aceitar a sua identidade de gênero – normalmente falta recursos para essa empreitada. 

A primeira vez de Alexia para esse fim foi em 2013. Ela tentou realizar a mudança de nome pela primeira vez, ainda em ação judicial, mas esse era um procedimento complexo para ela. À época, foi obrigada a apresentar um laudo psicológico e psiquiátrico e ter, no mínimo, três testemunhas físicas que atestassem sua mudança de gênero, além de autorização dos pais e uma comprovação de uso do nome social através das redes sociais, mesmo que não constasse no registro. Foram tantas as dificuldades, que acabou desistindo no meio do caminho. “Eu corri, batalhei, fui em posto de saúde, fiz cadastro. Teve todo um processo bem delicado, bem minucioso, bem complicado mesmo. Comecei até a ir atrás da documentação, passei pelo psicólogo e tudo, mas desisti porque era muito difícil, tinha que ter um batalhão de coisas. Sem contar que era particular e era caríssimo”, relembra. 

Após a primeira tentativa, tentou de novo. E depois outra vez. A cada nova tentativa, uma barreira que a fazia desistir. E isso foi adiando o sonho da sua retificação. “Eu ficava perdida, não sabia a quem recorrer ou como conseguir a documentação. Tinha em mãos a lista com os documentos necessários, mas eu tinha que correr atrás. Era pago. Eu tinha que pagar muita coisa. A pessoa desempregada, sem dinheiro no bolso, complicava e desanimava bastante”

Nem sonhava que um dia iria vir trabalhar numa instituição que abraça sua demanda e transforma direito em realidade. Como colaboradora da Defensoria, em 2022, ela se viu rodeada de pessoas que a apoiaram em todo o percurso e começou a juntar a documentação necessária. Deu entrada mais uma vez.  

Hoje, a colaboradora do Núcleo da Defensoria do Segundo Grau da Defensoria, entende e ajuda as amigas e amigos neste processo. “Com a Defensoria Pública, não foi tão dificultoso assim. Eu ainda tive que me deslocar pra minha cidade natal, já que não sou registrada aqui na capital, mas em comparação há 10 anos, foi muito mais fácil. Nas outras três vezes, eu tentei, gastei dinheiro, me frustrei muito, porque eu me via perdida. Pela Defensoria foi fácil e rápido”, complementa. 

Portando a nova certidão, Alexia almeja não passar mais por constrangimento, tão comuns nesta caminhada. “Eu, por exemplo, numa fila de posto de saúde ou numa entrevista de trabalho, as pessoas não chamavam pelo nome social, mas pelo nome de registro. Era extremamente constrangedor. Hoje, tenho o nome que eu tanto quis: Alexia. Vai mudar muita coisa. Ninguém vai mais me olhar torto quando pegar o documento”, comemora. E divide a alegria. “Quando eu cheguei em casa, falei logo: ‘mãe, cadê?’. Minha mãe foi pegar o documento pra mim, me deu, abri e eu nunca fiquei tão feliz. Foram 10 anos tentando conseguir esse registro com esse nome maravilhoso, que eu sempre achei lindo. Quando eu peguei o registro na minha mão, foi uma felicidade tão grande, uma emoção tão grande, tão grande mesmo, que eu disse assim: ‘meu Deus, eu consegui! Depois de num sei quanto tempo, eu consegui!’”, emociona-se, Alexia Batista do Nascimento, dona da identidade que já era sua a tanto tempo.