Posso ajudar?
Posso ajudar?

Site da Defensoria Pública do Estado do Ceará

conteúdo

Na pausa discute reconhecimento fotográfico e a recente decisão do STJ

Na pausa discute reconhecimento fotográfico e a recente decisão do STJ

Publicado em

A reportagem especial do Fantástico deste domingo (21), trouxe à tona alguns casos de pessoas inocentes que foram reconhecidas nos “catálogos de suspeitos” em delegacias pelo Brasil. Em muitos dos casos, o reconhecimento por fotografia acabou sendo a única prova na hora de apontar o possível criminoso. Como foi o caso de um habeas corpus executado pela 17° Defensoria Pública de Santa Catarina (DPESC), por meio do defensor público Thiago Yukio Campos em favor de dois assistidos, ambos com condenação em primeira instância por suposta prática de roubo.

A partir dessa reportagem, o programa de debates e conversas ao vivo #NaPausa, convidou o defensor público estadual Thiago Yukio Campos para compartilhar sua experiência no caso, relatando o desfecho da decisão do Sistema Tribunal de Justiça (STJ) em absolver o suspeito, acusado exclusivamente com base no reconhecimento feito por meio de foto feita pelas vítimas. A condução do diálogo foi realizada pelo defensor público do Ceará, Aldemar Monteiro, titular nas Defensorias Criminais. O debate está disponível no instagram da Defensoria Pública do Ceará, através do LINK.

Thiago Yukio pontuou que a condenação do suspeito se baseava unicamente no reconhecimento de três vítimas na delegacia e que, quando questionadas no tribunal, acabaram mencionando circunstâncias que inviabilizariam a culpa do homem, como o uso de capuz e a altura do suspeito de 1,70m, quando, na verdade, o suspeito mencionado pela vítima tem 1,95m. O defensor argumenta que as provas que dependem da memória humana não são suficientes para condenar alguém. “A memória humana é falível, existem as falsas memórias que atrapalham o nosso julgamento, portanto o reconhecimento por fotografia interfere e pode criar essas falsas memórias. O reconhecimento fotográfico não deve ser usado como única prova de acusação”, afirma Thiago Yukio.

O STJ decidiu que é necessária uma nova interpretação do artigo 226 do Código de Processo Penal. Segundo o defensor Aldemar Monteiro, o reconhecimento equivocado de suspeitos tem sido uma das principais causas de erro judiciário, levando muitos inocentes à prisão. “É fácil etiquetar determinadas classes. O que mais nos chama atenção é o fato de pessoas que algumas vezes foram indiciadas ou já tiveram sido processadas figuram em álbuns de delegacias de polícias. Isso é triste. Esse etiquetamento ocorre e não temos como negar porque isso acontece majoritariamente com pessoas pobres e negras”, comenta o defensor.

“Nesse julgamento em Santa Catarina evidencia que o STJ não pretende ficar encapando essa ideia e, a partir de agora, devemos entender o que já deveríamos estar fazendo a muito tempo: intentar que a lei é obrigatória e que o reconhecimento por fotografia não tem previsão na lei. Qualquer descumprimento do artigo 226 torna a prova ilegal e não pode fundamentar uma condenação”, diz o defensor Thiago Yukio. O cumprimento das formalidades para o ato de reconhecimento, que até então era uma mera recomendação, teve confirmado seu status de condição necessária para que um reconhecimento de pessoa possa se configurar como prova. Sem essas formalidades não é possível confiar no resultado do reconhecimento, já que, devemos levar em consideração que a memória humana é falha. 

Finalizando, os defensores destacam que, na maioria dos casos, não existem protocolos de como realizar essa condução, provocando um “desrespeito que vergonhosamente vem sendo admitido no STJ”, dizem os defensores. Para eles, devem existir alguns protocolos específicos, tais como esclarecimento à vítima de que não é obrigado ela apontar um suspeito, explicar que a mesma pode ter dúvidas, outro ponto importante é que o condutor não deve saber quem é o suspeito dentre as fotos para evitar que mesmo, involuntariamente, possa influenciar a vítima, por fim, o procedimento deve ser gravado. “O reconhecimento do suspeito através da exibição de fotografias deve ser visto como etapa antecedente a eventual reconhecimento presencial”, destaca Thiago Yukio.

Por fim, Yukio apresentou a pesquisa “O reconhecimento fotográfico de acusados em Santa Catarina” que mostra que, mesmo após a decisão de outubro até o dia 1º de fevereiro, nenhum dos 26 casos que foram julgados em SC levou em consideração a recomendação do STJ, detalhando ainda um caso de vítimas que foram reconhecer o suspeito após 5 anos e 2 meses depois do ocorrido, evidenciando que ainda vigora uma completa informalidade nesses processos de condução. A pesquisa será lançada na próxima terça (02/03) no evento do Centro de Estudos, de Capacitação e de Aperfeiçoamento da Defensoria Pública de SC (CECADEP) e será transmitida às 17h ao vivo no canal da DPESC no Youtube.