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Audiência discute alternativas para evitar remoção de moradores afetados pelo binário da Santos Dumont

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Mais de 80 moradores da comunidade Verdes Mares, localizada no bairro Papicu, em Fortaleza, compareceram a audiência pública nesta quarta-feira (20) na sede da Defensoria. Em comum, todos queriam travar um diálogo com o poder público municipal sobre a notícia de desapropriação de cerca de 90 residências com um pedido para renegociação de valores, reassentamento ou modificações no percurso do trajeto. As desapropriações têm sido a saída apontada pela Secretaria Municipal de Infraestrutura (Seinf) para dar continuidade às obras do binário da avenida Santos Dumont. Os moradores estão situados no chamado “Beco da Galinha”, na rua Professor Silas Ribeiro, que seria alargada para dar vazão ao tráfego de veículos.

As famílias manifestaram vontade de permanecer na região. Elas reclamam da violência e da falta de acesso aos serviços públicos em áreas mais afastadas. Além disso, os moradores contestam o valor da indenização proposta pela Seinf. “O valor que eles oferecem é indigno. Temos que lutar porque ali está nossa moradia que construímos com nosso suor. Queremos permanecer”, disse a moradora Fátima Maria Rodrigues, que vive há 40 anos na região. Durante a audiência, moradores e autoridades trouxeram relatos de terrenos desocupados próximos ao local, que se encontra em uma área de Zona Especial de Interesse Social (Zeis), que poderiam contribuir para o reassentamento.

Compuseram a mesa da audiência pública o defensor público Lino Fonteles, supervisor do Núcleo de Habitação e Moradia (Nuham); a defensora pública e secretária executiva da Defensoria e titular do Nuham, Elizabeth Chagas; o vereador Raimundo Filho; a promotora de Justiça Giovana Melo (MPCE); Ivan Rui Frota, engenheiro da Seinf; Aguida Ribeiro, representante da Secretaria Municipal de Urbanismo e Meio Ambiente (Seuma); Jório Martins, representante da Secretaria Municipal do Desenvolvimento Habitacional (Habitafor); Juliane Melo, do Escritório Frei Tito e Lucas Lessa, membro da Organização da Sociedade Civil (OSC) Taramela, além de Maria de Fátima Rodrigues, moradora representando a comunidade.

O defensor público Lino Fonteles falou inicialmente da necessidade de reassentamento, caso as desapropriações se efetivem. “A comunidade não está com suas casas à venda. Ela está tendo que sair por uma demanda da Prefeitura. Então o correto é que se faça o reassentamento das famílias em local próximo. O direito a ser reparado aqui não é o concreto. Que se repare o direito à moradia”, argumentou o defensor Lino Fonteles.

O engenheiro da Seinf, Ivan Rui, informou que as indenizações foram calculadas a partir do valor de construção das residências. “É feito um cálculo sem considerar o valor do terreno, e tentamos aumentar um pouco, mas não muito”, disse. A Defensoria questionou os valores estipulados. “As famílias reclamam que o valor ofertado é baixo. Então perguntamos: qual o critério para a definição destes valores? Se é o metro quadrado construído, isso é relativo a que bairro?”, questionou a defensora Elizabeth Chagas.

IMG_2543Para evitar as remoções, um projeto alternativo de mobilidade foi criado e apresentado pela OSC Taramela. Com ajuda dos moradores do Beco da Galinha, arquitetos sugeriram à Seinf que mantivessem o binário com fluxo na Rua Desembargador Lauro Nogueira, evitando a angulação na Rua Professor Silas Ribeiro. Assim, os moradores permaneceriam no local. “Nossa proposta é não haver esse desvio, mantendo a ideia de binário e mais sustentável socialmente. Pelos nossos cálculos, atenderia ao objetivo da Prefeitura sem ferir o direito dos moradores”, explica Lucas Lessa, membro da Taramela. Como encaminhamento da audiência, o projeto será compartilhado com os órgãos municipais e MP para ser debatido em uma futura reunião.

Outro encaminhamento foi a regularização fundiária da área de Zeis onde está a comunidade Verdes Mares. “É uma outra medida mitigadora que deve ser pensada, para ir além da oferta de baixas indenizações. É um procedimento que se repete nas intervenções urbanas municipais. Deve-se pensar em regulamentar a permanência dos moradores com qualidade”, afirmou a promotora Giovana Melo, pedindo que o vereador e representantes da Câmara levassem o debate à Câmara Municipal de Fortaleza.

A professora Clarissa Freitas, do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Ceará (UFC), com frequência contribui com estudos de impacto social na área do direito à moradia. No período dedicado às falas da plateia, ela interrogou às autoridades sobre como a cidade estaria sendo pensada sem desigualdades. “A comunidade está lá há muito tempo. Não se pode abordar para pagar pelo tijolo. Aquela terra pode ser regularizada se a administração e os representantes dos vereadores quiserem. Vemos nossa cidade sendo repartida para o setor imobiliário. Então, fica o questionamento: qual é o critério para a cessão desses espaços? A necessidade ou lucro?”, questionou.

“Esse momento é importante para a gente. Vamos lutar e batalhar pelo nosso direito de permanência”, defendeu o morador Manoel Pereira. Ele foi seguido por outros moradores que denunciaram a falta de diálogo por parte do ente municipal, e pediram mais humanidade no planejamento da cidade. “Não podemos ser colocados como empecilho para o trânsito. A cidade também é feita para nós, pobres, então merecemos respeito à nossa vontade de permanecer naquele território”, disse o morador Levi João.

Segundo a representação da Seinf, as obras devem continuar normalmente, mesmo com o impasse quanto às desapropriações e sob protestos da comunidade. A Defensoria Pública e o MPCE vão tentar viabilizar uma agenda com o prefeito Roberto Cláudio para cobrar a realização de um projeto de mobilidade alternativo que leve em conta o direito à moradia da Comunidade Verdes Mares.