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Defensoria Pública impetra ação de indenização para moradores de rua

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O cenário não é comum e logo chama a atenção de quem passa nas proximidades da avenida Rogaciano Leite, em um dos bairros nobres de Fortaleza. O que parece ser são dois ambientes de uma casa. Sob duas árvores uma rede estendida, coberta por uma lona azul, que protege da chuva eventual que cai na madrugada, lençois e duas malas com alguns pertences. No outro ambiente, panelas ao fogo de chão, materiais de limpeza e alguns alimentos colocadas de forma organizada dentro de um isopor. Ali, vivem a recicladora Maria Aparecida Siqueira, 38, seu companheiro, Valdir Almeida da Silva, 27 e dois cachorros. Moradores de rua há mais de 10 anos, há doze meses se instalaram no canteiro central, da rua Atilano de Moura, no Guararapes.

Na manhã do dia 28 de dezembro de 2016, a rotina pautada pela simplicidade foi surpreendida pela ação de fiscais da Prefeitura de Fortaleza e da Guarda Municipal. Os catadores contam que os fiscais levaram o carrinho de coleta do material reciclável, assim como dez cestas básicas e uma barraca que haviam sido doadas pela população que reside nas imediações. Eles relatam que os guardas questionavam a presença deles ali no local e diziam que receberam denúncias anônimas. “O que eu não entendo é que todo mundo aqui gosta da gente, passam aqui frequentemente pra nos ajudar. Não sei que denúncia foi essa. Nós cuidamos desse local como se fosse nossa casa. É nossa casa”, ressalta Aparecida.

DSC_0211Valdir conta que os guardas tentaram detê-lo, a prisão só não foi possível após intervenção da população que mora no entorno. “As pessoas que moram aqui nos prédios perto da gente gostam muito de nós. De tempo em tempo eles doam cestas básicas, roupas, material de higiene. Eles têm ‘afeto’ por nós”, destaca o catador. Toda a ação dos guardas e fiscais da Prefeitura foi gravada pelas câmeras de segurança de uma concessionária de veículos localizada em frente ao canteiro que abriga o casal.

No mesmo dia, após conversarem com os moradores e serem orientados, Valdir e Aparecida vieram ao Núcleo de Direitos Humanos e Ações Coletivas (NDHAC) da Defensoria Pública do Estado do Ceará exigir seus direitos. “Eu sei que moramos na rua e sei como eles veem a gente, mas isso não dá o direito deles tomarem o pouco que a gente tem e da forma como eles tomaram”, diz Aparecida.

Depois da visita, um ofício foi enviado à Prefeitura com o objetivo de recuperar o que foi apreendido. Entretanto, só houve a devolução de uma cesta básica e do carrinho de coleta do material reciclável danificado. O NDHAC então abriu um ação de indenização por danos morais e materiais contra o município de Fortaleza, requerendo o valor de 20 mil reais para cada um dos catadores, Valdir e Aparecida, respectivamente.

DSC_0213Questionados sobre o que fariam caso conseguissem a indenização, a resposta foi unânime: comprar uma casa. “Nós já passamos por várias cidades. Já moramos em Teresina, Palmas, Tocantis. Eu me considero uma andarilha, na realidade. Mas se eu conseguir esse dinheiro, volto para Teresina, compro uma casa lá e coloco ela no nome dos meus filhos que deixei na Paraíba”, conta Aparecida. Para Valdir não é diferente, o sonho da casa pode ser realizado caso a ação seja deferida. “Olha, eu quero ter meu cantinho. Eu gosto de trabalhar como catador e trabalhar com reciclagem, mas não dá pra comprar uma casa com esse serviço”, explica.

A defensora pública do NDHAC Sandra Sá afirma a atuação do Núcleo no que tange à defesa dos direitos dessas pessoas em situação de rua. “Nós aqui temos uma atuação ostensiva no que diz respeito à salvaguardar os direitos dessas pessoas em situação de rua. Atendemos as demandas dessa população vulnerável e entramos com essa ação para cobrar da Prefeitura a indenização em razão da ofensa que eles sofreram. Em qualquer ação de danos morais, tem que se comprovar a efetividade do dano e nesse caso há como comprovar. As provas estão claras, inclusive com filmagens”, finaliza.