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Rompendo o silêncio dos relacionamentos abusivos

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rel abusivo

“Eu nunca achei que ele fosse me tratar daquela forma e me fazer passar por todo aquele inferno. Eu achava que aquilo era com os outros, nunca comigo”. O relato de Maria Augusta*, 35, é comum para várias mulheres que vivenciam no seu dia a dia os primeiros indícios de violência: o relacionamento abusivo.

O relacionamento de Maria Augusta durou 10 anos e trouxe três filhas. Ela conta que, mesmo com as crianças pequenas, o marido, à época, não exitava nas agressões. “Antes ele era muito ciumento, depois que casamos, eu com 20 anos, ele começou a me agredir fisicamente. Quando tive as meninas, ele me trancava no banheiro e só deixava eu sair quando eu fazia o que ele mandava e elas ficavam chorando pedindo por mim. Era um terror”, conta.

Se perceber em uma relação abusiva é muito difícil porque significa romper os silêncios. Mas é uma possibilidade real para qualquer pessoa que esteja em um relacionamento, independente de classe, sexo, gênero ou sexualidade. A supervisora e defensora pública do Núcleo de Enfrentamento à Violência Contra a Mulher (Nudem) da Defensoria Pública, Jeritza Braga, explica que, assim como o caso de Maria Augusta, os indícios de um relacionamento abusivo estão diretamente ligados à violência psicológica e emocional. “É difícil de identificar no início esse tipo de violência, porque, geralmente, ela está mascarada como cuidado, amor e proteção, o que não é verdade”, explica. A defensora explica que a violência psicológica logo pode ser identificada nos comportamentos que limitam a liberdade do outro; seja pela roupa a ser escolhida, pelo lugar que a pessoa deve ou não frequentar e dos horários dela.

“A gente primeiro percebe como amor demais, cuidado demais e eu era muito nova pra identificar que aquilo era uma violência e que era um sinal de que mais violência viria”, relata Maria Augusta. Ela namorou dois anos antes de se casar e conta que passou por situações constrangedoras durante o relacionamento. “Uma vez ele bateu em um amigo que veio me cumprimentar, porque ficou com ciúmes. Nesse dia eu quis terminar o relacionamento e ele não permitiu. Chorava, pedia perdão e dizia que ia mudar”.

Diferentemente de uma agressão física, a emocional é sutil. Muitas vezes, ela é percebida por uma série de tentativas de manipulação para que o parceiro se sinta culpado e se sinta responsável por todas as ações ruins no relacionamento com o outro. Esta característica estende-se a outras áreas da vida, já que o agressor tende a considerar que todos os acontecimentos negativos da sua vida são da responsabilidade do parceiro, fazendo-se de vítima, quando na verdade, está se tornando o algoz.

Segundo relatório da Organização das Nações Unidas (ONU), três em cada cinco mulheres sofreram, sofrem ou sofrerão violência em um relacionamento afetivo. O número pode ser maior ao levarmos em conta a diversidade sexual já que os relacionamentos abusivos não escolhem sexo e podem ser vistos também nas relações homem/homem e mulher/mulher.

No caso de Maria, mais de 10 anos depois, ela ainda sofre consequências do que o ex-marido causou, mas se diz tranquila. “Hoje eu posso dizer que sou feliz com as minhas filhas e acredito que Deus tem guardado o melhor pra mim todos os dias”, diz esperançosa.

Assim como ela, outras mulheres também têm dificuldade de identificar os primeiros indícios de violência psicológica e emocional de um relacionamento abusivo. Identificamos a seguir alguns aspectos que podem auxiliar no reconhecimento:

Estou em um relacionamento abusivo?

Sinais de possessividade (o companheiro/a promove o seu isolamento de outras relações, como  amigos, família e colegas); controle (as atividades que você faz passa por uma gerência do parceiro/a, que reage mal, às vezes agressivamente, quando você não faz o que ele/ela quer); superioridade (ele/ela precisa ganhar sempre ou estar “certo”); manipulação (a pessoa pode mentir, alegar que a culpa na verdade é sua, ou fazer que você sinta pena dele); mudanças de humor (a pessoa pode ser abusiva em um momento e carinhosa ou humilde em outro); ações não correspondem as palavras  (diz que ama, mas maltrata e não cumpre o que diz); punição/chantagem (priva de sexo como castigo, faz jogos silenciosos); isolamento (a pessoa não quer se abrir, nem discutir o assunto com você ou ninguém, embora talvez fale mal de seu comportamento aos outros.

Você conhece alguém que está em um relacionamento abusivo?

Caso você identifique que algum amigo, colega de trabalho ou parente esteja em um relacionamento abusivo, é imprescindível que você esteja presente para essa pessoa, ajudando a reconhecer que o abuso não é “normal” e que nada do que acontece é por culpa dela. Ainda que a pessoa decida continuar com o parceiro, é importante que ela saiba que pode conversar com você. Principalmente: seja presente na vida dessa pessoa; ouça e apoie, ela precisa dos seus cuidados.

Núcleo de Enfrentamento à Violência Contra a Mulher (Nudem)

A violência física integra as diversas violências iniciadas pelo relacionamento abusivo. Mesmo sendo identificável em relacionamentos heterossexuais e homossexuais, os números destas violências têm como grande vítima a mulher.

Neste contexto, o Núcleo de Enfrentamento à Violência Contra a Mulher (Nudem) da Defensoria Pública atua na área que envolve o requerimento das medidas protetivas de urgência previstas na Lei Maria da Penha e encaminhamento para a rede de proteção existente no Estado e no Município, além da defesa dos direitos das mulheres, prestando toda a assistência, como educação em direitos, orientação jurídica, ajuizamento de ações necessárias de acordo com o caso.

Em 2017, o Nudem já realizou 2084 procedimentos que envolvem a defesa dos direitos das mulheres que se encontram em situação de violência doméstica e familiar. O Núcleo presta assistência, como educação em direitos, orientação jurídica, ajuizamento de ações necessárias de acordo com o caso (alimentos, divórcio, dissolução de união estável, guarda, etc.), requerimento das medidas protetivas de urgência previstas na Lei Maria da Penha e encaminhamento para a rede de proteção existente no Estado e no Município.

Núcleo de Enfrentamento à Violência Contra a Mulher (Nudem)
Rua Padre Francisco Pinto, 363, Benfica
Tel.: (85) 3101.2259 / 3278.7192

*O nome e a idade da personagem foram alterados*