Defensoria Pública do Ceará destaca impacto de decisão do STF por termo mais inclusivo para pessoas trans em declarações de nascimento
TEXTO: TARSILA SAUNDERS, ESTAGIÁRIA DE JORNALISMO SOB SUPERVISÃO
ILUSTRAÇÃO: VALDIR MARTE
A chegada de um filho é um momento inesquecível para muitas famílias. Esse instante de ver uma nova vida nascer, no entanto, sempre esteve formalmente associado ao termo “mãe” nos registros oficiais, que identifica dessa forma a pessoa que deu à luz. Para homens transsexuais e pessoas não-binárias que também podem gestar, essa designação acaba por excluir essas identidades de gênero que não se identificam com esse termo.
Diante desse cenário, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a Declaração de Nascido Vivo (DNV) — documento emitido logo após o nascimento do bebê — poderá utilizar o termo “parturiente,” que se refere ao indivíduo que deu à luz sem remeter a gênero específico.
A Defensoria Pública do Estado do Ceará (DPCE) destaca a importância dessa mudança e reforça seu papel em garantir o respeito pleno às identidades nos registros oficiais, comprometida com a defesa dos direitos da população LGBTQIAPN+.
“Essa decisão não apenas elimina o desconforto e a inadequação que o termo ‘mãe’ gerava para famílias compostas por pessoas transsexuais e não-binárias, mas também reafirma o direito dessas pessoas de serem plenamente reconhecidas e respeitadas pela legislação. Esse avanço tira da invisibilidade quem, até então, não tinha sua própria identidade acolhida nos documentos iniciais de seus filhos,” explica Lia Felismino, defensora pública e assessora de relacionamento da DPCE.
Famílias transcentradas e o impacto da decisão
A decisão do STF traz impacto direto a diferentes famílias, como a de Ella Monstra e Beija Aragão, casal trans que contou com o apoio da DPCE para o processo de retificação de nome e gênero e agora aguarda a chegada de um bebê. Beija, artista visual e realizador audiovisual, compartilhou o alívio e a segurança que sentiu ao saber da decisão.
“Fiquei muito feliz com a decisão do STF, pois me trouxe tranquilidade em saber que posso ter meus direitos garantidos nesse momento tão especial da minha vida. Com certeza esse ato irá promover não só para mim, mas para outras famílias transcentradas, a possibilidade de deixarmos de ser invisíveis nesse ambiente e garantir o respeito dos profissionais e demais pessoas com famílias como a minha, que merecem dignidade”
Para Beija, a gestação representa um momento de transformação e esperança, apesar dos desafios sociais e de saúde que ele está enfrentando ao longo do processo. “A gravidez tem sido uma experiência que me traz esperança e me faz imaginar um futuro que nunca pensei possível. Recebemos muito apoio de amigos e conhecidos, mas, ao mesmo tempo, enfrento transfobia, com comentários que invalidam minha identidade. É doloroso e traz preocupações sobre o futuro que meu filhe e nossa família podem enfrentar. Ainda assim, existimos e resistimos, e criaremos nosso filhe com muito amor, respeito e liberdade”.
Ella Monstra passou pela etapa de retificar o nome e gênero em documentos oficiais com a DPCE. Ela foi uma das 198 pessoas que participaram do programa Transforma de 2024.
A defensora Lia Felismino destaca que a instituição oferta o suporte às famílias que buscam orientação e retificação de documentos de identidade para alinhar também informações pessoais e familiares. “A partir dessa decisão, nosso compromisso é fortalecer o acesso dessas famílias ao registro civil inclusivo e representativo para pessoas trans e não-binárias no Ceará e mudar esse cenário de invisibilidade”, finaliza.