Posso ajudar?
Posso ajudar?

Site da Defensoria Pública do Estado do Ceará

conteúdo

Como quem carrega uma filha pela primeira vez nos braços, pais se emocionam ao ver nome de Lara assegurado no papel

Como quem carrega uma filha pela primeira vez nos braços, pais se emocionam ao ver nome de Lara assegurado no papel

Publicado em

Acompanhar o nascimento de alguém é sempre um momento de extrema emoção. Durante nove meses, o bebê começa a se desenvolver e um turbilhão de sentimentos toma conta da cabeça dos pais. Alegria, medo, insegurança e ansiedade ao mesmo tempo e em alta dosagem.

 

Para o autônomo Jânio Magalhães Torres e a jornalista Mara Beatriz Mendes Magalhães, o dia 2 de dezembro de 2021 ganhou uma proporção ainda maior com todos esses sentimentos envolvidos. A filha do casal, Lara Mendes Magalhães Torres, de 16 anos, recebeu no Cartório a certidão de nascimento retificada. Há quase cinco reivindica o direito à própria identidade.

Em julho, a família procurou o Núcleo de Direitos Humanos e Ações Coletivas (NDHAC) da Defensoria Pública do Ceará (DPCE) para dar entrada na ação de retificação de nome e gênero no registro civil, em outubro saiu a decisão judicial autorizando a mudança e hoje foi dia da família receber o documento.

“É um renascimento mesmo. Uma sensação de renascer, porque é uma luta de cinco anos que a gente enfrenta, desde que a Lara se reconheceu como uma menina trans, que foi aos 12 anos. A gente já enfrentou tanta coisa, tantas dificuldades, tanto preconceito. Na escola. Teve que procurar a Defensoria. Ir atrás dos nossos direitos. Estamos sempre com as leis em mãos pra mostrar às pessoas que respeito é uma obrigação, não é nada mais que uma obrigação”, relata a mãe Mara Beatriz Mendes Magalhães, que transbordava emoção.

O pai, de braços dados com a filha e a esposa, não escondia a emoção. Chorou ao ver o documento como quem carrega uma filha pela primeira vez nos braços. “O sentimento de hoje é de liberdade, correntes e tabu quebrados. Todos os pais que têm filhos que sejam LGBTQIA+, independentemente do órgão genital que ele carrega, respeitem, porque se eles se identificam, eles realmente são, eles sentem. E amem, independentemente. Amem. Eles precisam muito desse amor de vocês, porque lá fora eles já têm o não. Então, facilitem a vida deles dentro de casa. Dêem um sim e amem seus filhos”, destacou Jânio.

“Eu me sinto realmente livre depois de hoje. Um sentimento de libertação. Finalmente poder superar esse meu passado, deixar pra trás todas essas batalhas, tudo isso que a gente passou juntos e finalmente olhar para um futuro novo. Meus planos são prestar vestibular, entrar numa faculdade. No momento, é isso praticamente. Terminar meu ensino médio e continuar essa luta. Que outras meninas ou meninos transexuais possam se fortalecer com a minha história”, conta Lara.

Para a defensora pública que deu entrada na ação, a supervisora do NDHAC, Mariana Lobo, “o caso da Lara está sendo um referencial para essas famílias, abrindo portas para quem vem depois, e isso é muito importante para que outros adolescentes possam ter a Lara como referencial e encontrar na Defensoria esse porto seguro. É um importante passo na perspectiva da garantia dos direitos humanos, da não discriminação e o direito absoluto e incondicional da identidade de gênero ”, comenta Mariana.

Ela comenta que, em média, recebe na sede do Núcleo cerca de vinte pessoas por mês querendo orientações sobre o procedimento de troca de nome e gênero. “Em muitos casos são mães de adolescentes procurando informações”, complementa Mariana.

O processo da Lara tramitou na 3a Vara da Infância e Juventude de Fortaleza. Atuante no órgão, o defensor público Adriano Leitinho destaca a vitória de Lara. “É muito importante esta atuação que respeita a decisão de pais e jovens sobre sua identidade. O direito à personalidade é olhar a sua forma de se colocar no mundo. Assim como os adultos, a criança e o adolescente também têm direito fundamentais e estes devem ser respeitados e assegurados, conforme garante o ECA e a Constituição. É muito gratificante ver que estas ações têm tido desdobramentos positivos, levando dignidade a todo o seio familiar da Lara, Leah e de tantos outros meninos e meninas que reconhecem-se e são reconhecidos como sujeitos de direitos”, destaca.

MENOS BUROCRACIA
Desde março de 2018, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconhece a identidade de gênero como direito humano e algo que pode ser obtido apenas por meio de uma autodeclaração, não sendo mais necessário apresentar tratamento hormonal, laudos médicos ou comprovantes de cirurgias. Basta ir diretamente ao cartório de registro para realizar essa modificação. Quem não pode custear as taxas que são cobradas, deve buscar a Defensoria Pública para atestar a hipossuficiência. Nos casos de crianças e adolescentes, é preciso judicializar a ação.
Antes da decisão do STF, todos os pedidos eram solucionados por decisão de um juiz. Em 2017, o Núcleo de Direitos Humanos da Defensoria deu entrada em 17 ações judiciais de retificação de nome e gênero no registro de nascimento de pessoas transexuais. No ano seguinte, esse número passou para 75 procedimentos. Já em 2019, um ano após a decisão do STF, foram 122 procedimentos administrativos, um aumento de 62% nos pedidos sem a necessidade de judicialização.
Em 2020, os atendimentos foram afetados pelo isolamento social decorrente da pandemia e 61 pessoas procuraram o órgão para dar entrada na retificação de nome e gênero. Já neste ano, o NDHAC tem até o mês de outubro 140 pedidos.

A Defensoria tem acompanhado o caso de Lara. Clique aqui

SERVIÇO
Devido à pandemia do novo coronavírus (Covid-19), a Defensoria Pública do Ceará atende preferencialmente de forma remota. No site www.defensoria.ce.def.br há um banner vermelho com os contatos de telefones e e-mails de todos os núcleos especializados da instituição e das cidades que contam com a atuação de defensores públicos. O atendimento presencial acontece apenas por agendamento. Os contatos do NDHAC são:
Telefone: (85) 98895-5514 / (85) 98873-9535
E-mail: ndhac@defensoria.ce.def.br